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A islamofobia será da responsabilidade dos próprios muçulmanos se estes não actuarem

Fonte: Said López / Webislam – Acomodação/Versão Portuguesa: M. Yiossuf Adamgy / Al Furqán

Nós, muçulmanos, estamos a transformamo-nos em autênticos islamofóbicos

A islamofobia é o tema mais popular nos meios de comunicação. Não somente ouvimos falar nela, como a vivemos no nosso quotidiano. A Sra. Ndeye Andújar, no artigo que publicou, procura um medicamento contra esta epidemia. Nesse artigo, fala-nos de uma pessoa que considera aberta a outras culturas mas que teme não ser capaz de não se tornar numa pessoa islamofóbica devido a tudo o que a rodeia. Mas há uma realidade muito mais complexa. Não são apenas as pessoas que não são muçulmanas que sofrem este fenómeno próprio dos dias de hoje, designado por islamofobia, mas tam-bém nós, muçulmanos, estamos a transformarmo-nos em autênticos islamofóbicos. Como, perguntarei eu às minhas irmãs e irmãos muçulmanos? Quando entrais num lugar público, quer seja um supermercado, o metro ou o cinema, ou algo desse género, não tendes a sensação de que as pessoas que vos rodeiam pensam que sois uma pessoa introvertida, que odeia aqueles que não sejam muçulmanos, que sois ignorantes ou oprimidos e que não vos tenhais integrado na sociedade? E isto verifica-se sobretudo relativamente às mulheres muçulmanas cuja vestimenta reflecte, de imediato, a sua identidade religiosa. Caso a resposta seja afirmativa, então, digo-vos uma coisa, que talvez não quereis ouvir: Estais contagiados pela epidemia da islamofobia. Sois uns muçulmanos islamofóbicos. Isto significa que as pessoas mal-intencionadas venceram-nos, a nós, muçulmanos. Isto significa que, momentaneamente, aqueles que inventaram este fenómeno estão em vantagem em relação a nós. E o que podemos nós dizer de determinados meios de comunicação? Nada mais fazem do que divulgarem notícias que nos podem afectar negativamente. Não vereis nenhuma boa notícia na qual se falará bem dos muçulmanos.

O que vamos fazer? Darmo-nos por vencidos? Ou aguardarmos que alguém faça algo por nós? Ou esperar que desça um milagre do céu que proclame ao mundo inteiro que somos cidadãos normais e, até, exemplares?

Se esperarmos que aconteça algo deste género, então, tenho muita pena, mas não acontecerá nada do que estamos à espera. No Islão, não temos nenhuma instituição, à semelhança do Vaticano, que sirva de autoridade para todos os muçulmanos e que possa falar em nome de todos nós. Também não existe o conceito de missionários como se verifica no Cristianismo, pois, não existem conversões forçadas. A prova disso verifica-se na nossa terra, em Espanha: os califas e sultões da Andaluzia tiveram tempo suficiente (mais de setecentos anos) para converter ao Islão toda a Península Ibérica recorrendo ao poder absoluto. Mas tal não se verificou. Querem outro exemplo? Os países balcânicos: o governo Otomano governou durante mais de quinhentos anos nas terras que pertencem actualmente à Grécia, à Bulgária e à Roménia, mas ninguém forçou os povos que aí viviam a mudar de religião ou de língua. Então, como é que o Islão pôde exprimir-se nessas terras e expandir-se em tão pouco tempo? Embora as pessoas não tenham aceitado o Islão como modo de vida, como é que esta religião pôde governar em paz e com referências admiráveis durante tantas décadas? Se nós, muçulmanos, não temos uma instituição ou uma entidade, nem nenhum meio de comunicação aceitável em diversos sectores, quem nos representa em todo o mundo? Sobre quem recai esta responsabilidade?

Já não existem estados que ostentem a bandeira do califado sobre todos os muçulmanos. Então, por que razão não fazemos nós algo de forma individual? Hoje em dia, esta representação da forma correcta do Islão passou do Fard-al-Kifaya ao Fard-al-Ayn (da obrigação de toda a comunidade à obrigação de cada indivíduo). Todos os muçulmanos deveriam fixar-se neste ponto tão importante e actuarem de acordo com o que Allah, Subhana wa taala, diz a todos os muçulmanos: somos o Seu califa na terra. Individualmente, cada muçulmano é um represen-tante de Allah neste mundo.

Nos tempos actuais, em que muitos estão contra os muçulmanos e contra o Islão, enquanto representantes de Allah temos uma carga muito pesada sobre os nossos ombros: representar de forma conveniente o Islão em todos os seus aspectos. Esta é uma obrigação tão importante como a oração (salat) ou como o jejum, ou até é uma obrigação maior.

Os erros e pecados pessoais podem ser perdoados por Allah, mas as pessoas que nos rodeiam, aquando do Dia do Juízo Final, colocarão ambas as mãos no nosso regaço e perguntar-nos-ão: por que razão não fizeste nada em relação a isso? Se tivesses feito alguma coisa, eu teria alterado a minha maneira de pensar! Que diremos nós aos nossos filhos quando nos perguntarem por que razão os deixámos em apuros e não fizemos nada para mudar alguma coisa? Isto não significa que sejamos missionários, nada disso. Não estou a falar de tentarmos converter as pessoas ao Islão. É claro que acreditamos que o caminho correcto é aquele que o Criador dos céus e da terra nos enviou. Claro que gostaríamos que todas as pessoas que nos rodeiam, os nossos familiares, os nossos amigos, e todo o mundo inteiro, pudessem sentir o que sente um muçulmano no seu íntimo. Claro que pedimos para eles que Allah ilumine as suas almas, mas apenas Allah é o Muqallibal Qulub (quem muda os corações). Antes de mais, o nosso primeiro dever e obrigação consiste em quebrar os estereótipos e procurar sarar a imagem danificada do Islão.

Como podemos nós consegui-lo?

Temos muitas coisas para fazer. Por Allah. Ninguém nos pede que nos atiremos num campo de batalha. O Santo Profeta (a paz esteja com ele) disse, ao regressar da Batalha de Uhud onde muitos muçulmanos tinham sido martirizados: ‘Regressamos da jihad menor para a jihad maior’. Os companheiros do Profeta perguntaram-lhe ‘Há alguma jihad maior do que esta?’, ao que o Profeta (a paz esteja com ele) lhes respondeu: ‘A luta contra o nafs’ (contra o nosso ego).

Devemos lutar contra o nosso conforto: quantos de nós podem dizer que conhecem o vizinho que mora em frente à nossa porta? E o que vive no andar de baixo, o que vive no andar de cima? E o que vive no último andar? Quantas vezes os convidámos para que jantassem connosco em nossa casa, para tomar um café, para que vejam que somos pessoas normais, como eles, que temos família, que temos um computador, que temos livros para ler, que também gostamos de petiscar, comendo azeitonas, que também gostamos de comer paella, que também ficamos contentes quando a selecção nacional ganha? Quantas vezes lhes oferecemos um doce do Ramadão ou meio quilo de carne aquando do Eid-al-adha, explicando-lhes que se trata de uma tradição abraâmica, o pai dos Profetas? Quantas vezes lhes comprámos uma prenda para o seu aniversário ou lhes demos os parabéns na ocasião das suas festividades como, por exemplo, no Natal, em que dizem que nasceu o Messias? Quantas vezes lhes disse-mos que nós também acreditamos neste milagroso nascimento, que não fazemos nenhuma distinção entre os enviados de Allah e que daríamos as nossas vidas por Jesus sem pensar-mos duas vezes?

Um dia, quando for necessário – Allah Sub-hana wa taala manifesta o Seu poder através das causas – as únicas pessoas que poderão pôr um término às críticas contra nós, muçulmanos, serão essas pessoas a quem, a um determinado momento, nos apresentamos e que nos conheceram, tal como somos, com total transparência.

Se os muçulmanos … tivessem dialogado mais com o ‘outro’, talvez tivéssemos podido evitar a catástrofe: ‘Esperai! Eu conheço o meu vizinho, é muçulmano, ajuda o seu vizinho, da sua palavra e da sua acção não tememos nenhuma maldade, temos muitas coisas em comum, não permitirei que lhes façais nenhum mal, nem a ele, nem à sua família!’.

Em primeiro lugar, para cumprir o Fard-al-Ayn, todos os muçulmanos devem fazer tudo o que podem para serem transparentes e amigáveis para com as pessoas que os rodeiam e, além disso, têm que se esforçar para conhecerem o maior número possível de pessoas oriundas de todas as classes: os estudantes relativamente aos seus professores, os trabalhadores relativamente aos seus superiores hierárquicos, as donas de casa relativamente ao seu cônjuge e aos seus vizinhos, etc.

Em segundo lugar, as entidades e organismos islâmicos, para que possam cumprir o Fard-al-Kifaya, devem organizar mais actos de apresentação: reuniões onde imperam o diálogo e a compreensão, nas quais não se mencionem as diferenças, mas apenas os pontos comuns, festivais de arte e todas as actividades originais que possam surgir. (1)

Se actuarmos desta forma, Allah pode transformar, mediante uma única ordem Sua, os Invernos em Primaveras. Caso contrário, não teremos sido capazes de erguermos a carga que Allah colocou nos nossos ombros e que é a única maneira de procurarmos agradecer-Lhe pelo tesouro mais valioso que possa existir no universo: o Islão.

(1) – N. Tradutor: Um destes actos foi, recentemente, por mim presenciado (11 de Dezembro) no Colégio Islâmico de Palmela: um convívio-diálogo-confraternização do Colégio com as autoridades autárquicas e vizinhos. Parabéns! Mas é preciso mais…

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