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Carta Aberta a Barak Hussein Obama

Pelo Dr. Mahathir Mohamad, antigo Primeiro-Ministro da Malásia
in Global Research, 2 de Janeiro de 2009

Presidente-eleito dos Estados Unidos da América

1 de Janeiro de 2009.

Caro Sr. Presidente:

Não votei em si nas Eleições Presidenciais, pois sou malaio.Mas considero-me representado por si, na medida em que aquilo que faz e diz afectar-me-á a mim, assim como ao meu país.Aprecio a sua promessa de mudança. Sem dúvida que o seu país, os Estados Unidos da América, precisa de grandes mudanças. Assim é porque os americanos se tornaram no povo mais odiado do mundo. Nem os europeus simpatizam com a vossa arrogância. Ainda assim, o vosso povo já foi admirado e amado por ter libertado vários países da conquista e subjugação.

é tradição fazerem-se resoluções no dia de Ano Novo. Já deve ter feito uma lista com as suas boas resoluções. Mas poderei, amavelmente, sugerir-lhe que se empreenda a realizar as seguintes, em busca da Mudança?

  1. Parar de matar gente. Os Estados Unidos gostam muito de matar gente de forma a alcançarem os seus objectivos. Chamam-lhe guerra, mas actualmente a guerra não é feita por soldados profissionais a lutarem entre si e a matarem-se uns aos outros. A guerra tem agora como objectivo matar pessoas, centenas de milhares de pessoas comuns, inocentes. Países inteiros serão devastados.A guerra é algo primitivo, a forma que os homens das cavernas têm de resolver os problemas. Ponha um ponto final ao aumento do poderio bélico e ao planeamento de futuras guerras.
  2. Parar com o apoio indiscriminado em dinheiro e armas que é dado aos assassinos israelitas. Os aviões e as bombas que matam os cidadãos de Gaza são oriundos do seu país.
  3. Parar de aplicar sanções a países que não podem fazer o mesmo ao seu. No Iraque, as sanções impostas pelo seu país mataram 500 000 crianças, por privação de medicamentos e comida. O que conseguiram à conta desta crueldade? Nada, a não ser o ódio das vítimas e daqueles que pensam correctamente.
  4. Impedir que os vossos cientistas e investigadores criem novas armas diabólicas para matar mais pessoas de forma mais eficiente.
  5. Impedir que os vossos fabricantes de armas as fabriquem. Parar com a venda de armas ao mundo. É dinheiro manchado de sangue aquele que ganham nesses negócios. Não é uma atitude cristã.
  6. Parar de tentar democratizar todos os países do mundo. A democracia pode funcionar nos Estados Unidos, mas nem sempre funciona noutros países.
    Não matar pessoas por não serem democratas. A vossa cruzada pelo democratização dos países já matou mais gente do que os governos autoritários que derrubaram. E, de qualquer forma, não foram bem-sucedidos.
  7. Acabar com os casinos a que chamam instituições financeiras. Acabar com os fundos especulativos, derivados e negócios cambiais. Impedir que os bancos emprestem dinheiro inexistente aos biliões.
    Regular e supervisionar os bancos. Prender os facínoras que lucraram com o abuso do sistema.
  8. Assinar o Protocolo de Kyoto, assim como outros acordos internacionais.
  9. Demonstrar respeito pelas Nações Unidas. Cheguei a muitas outras resoluções para a mudança, as quais considero que deveria ter em consideração e pôr em prática. .

Mas penso que esta ementa para o ano de 2009 da era cristã já é suficiente. Se conseguir realizar apenas algumas das sugestões que lhe proponho, já será recordado como um grande líder. E os Estados Unidos voltarão a ser a mais admirada nação do mundo. As vossas embaixadas poderão então retirar as altas vedações e os rolos de arame farpado que as rodeiam.

Desejo-lhe um Feliz Ano Novo e uma excelente Presidência.

Os meus respeitosos cumprimentos.

Mahathir bin Mohamad (Antigo Primeiro-ministro da Malásia)

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Carta aberta aos intelectuais ocidentais

Por: M. Yiossuf Adamgy

Aos ilustres intelectuais, Judeus, Cristãos, laicos e outros, é minha intenção dizer-lhes algo, mas algo que contenha algum significado. O objectivo, ainda que relativo, será possível de se atingir? Conseguirão ouvir, compreender?

Aquilo que se passa no Médio Oriente, de uma gravidade extrema e mais do que premeditado, está para além do entendimento.

Se as reacções dos extremistas político-religiosos, usurpadores do nome do Islão, especialmente após o 11 de Setembro, arruinaram os esforços daqueles que trabalham pelo diálogo e pela coexistência entre o Oriente e o Ocidente, a política belicista e as agressões do Governo de Israel, conduzido pelo extremismo Sionista,

cava a sepultura, não apenas da possibilidade de paz na região, mas do futuro da humanidade.

Terrorismo de um Estado poderoso, dotado de armas de destruição em massa; estado diferente dos outros, de fronteiras desconhecidas, que não cumpre dezenas das Resoluções da ONU, que age na impunidade, contra uma resistência legítima, que defende o direito à vida e visa as forças armadas ocupantes, contra um terrorismo dos fracos, enquanto este último tem como objectivo os civis.

O povo Judeu tem o direito à segurança e à paz. Mas Israel não tem o direito de transgredir as leis universais, ao manter uma ordem colonial desumana. Trata-se de clara “extinção duma nação”, conforme quatro dos mais conhecidos intelectuais ocidentais divulgaram numa recente carta denunciando o que chamam de “moral dupla do Ocidente” em relação ao que vem acontecendo no Médio Oriente, no conflito entre Israel e Palestina. Noam Chomsky e os escritores Harold Pinter, José Saramago e John Berger assinam o texto que denuncia “uma prática militar, económica e geográfica de longo prazo, cujo objectivo político é nada menos do que a extinção da nação palestiniana”.

A actual desordem internacional encontra-se fundamentada sobre a lei do mais forte. Israel recusa toda e qualquer negociação com os países Árabes, multiplicando os actos unilaterais e a espoliação de terras. [b]Age em contradição às leis, à natureza e à moral, ergue um muro de separação, e mantém as populações Palestinianas presas num perfeito apartheid, assassinando personalidades políticas em pleno dia. Aprisiona, extremista e excessivamente, militantes nacionalistas e responsáveis Palestinianos, sendo que são já mais de dez mil. Destrói casas e infra-estruturas sem cessar, bombardeia bairros civis, tortura, priva de alimento todo um povo e bloqueia todas as suas receitas, por mais pequenas e magras que sejam.”

Neste contexto de morte, a principal potência mundial, os Estados Unidos, apoiam Israel incondicionalmente. Os países Europeus fecham os olhos, ou pedem às vítimas que reconheçam sem condições o seu carrasco. Cúmulo do absurdo, os países Ocidentais punem o povo Palestiniano por este ter escolhido democraticamente os seus representantes. A política dos dois pesos e das duas medidas ultrapassou todos os limites.

Porquê esta obstinação e esta quezília? Qual é a repressão e quais são as suas causas, sobre as quais o Ocidente não pretende pensar? Onde está a Democracia, onde estão os valores da modernidade? Onde está a Justiça e o Direito? Quem fez do Mundo refém?

Antes que a humanidade naufrague num sistema faustiano, que não oculta mais as suas intenções, dizemos nós, especialmente àqueles de entre nós, a grande maioria, que acreditam por força da razão, nas virtudes do diálogo e na necessidade do viver em conjunto: a repressão brutal e as odiosas agressões a que submetem quase diariamente os povos Palestiniano e Iraquiano e, agora, Libanês, representam uma trágica realidade. Realidade de um cancro que, aparentemente, ninguém pretende curar.

Como o realça o historiador pacifista, Ilan Pappe, docente da Universidade de Haifa, levar a cabo represálias contra uma operação de uma tão fraca amplitude, recorrendo a actos de guerra total e de destruição em massa, prova que o que se tem em conta não é o pretexto, mas sim um projecto de dominação. Os dirigentes Israelitas continuam com as operações de repressão programada, as quais depois de cinquenta anos provocaram a expulsão da maioria da população autóctone da Palestina, destruíram a maioria das suas cidades e mergulharam o mundo Árabe num conflito extenuante com o Ocidente. O que em uns, agravou o ódio pelo Islão, esse desconhecido, e, em outros, criou um sentimento sem igual.

Além disso, o poder militar Israelita desenvolve-se e a comunidade internacional mantém-se passiva ou cúmplice; mais, é fácil terminar o que começou em 1948: a colocação sob tutela progressiva de todo o mundo Árabe, rico em energia e o alargamento da fractura entre as duas margens do Mediterrâneo. Tudo isto em detrimento dos interesses de todos os povos do Mundo, incluindo o povo Judeu. Não é demasiado tarde para parar este plano. “

Certo, as reacções desesperadas de determinados grupos extremistas, assim como as contradições, as incoerências e os arcaísmos dos regimes Árabes e Islâmicos, em nada contribuem para a credibilidade e popularidade internacional da resistência. Opor a ocupação de Gaza e da Cisjordânia, à do Iraque por parte do EUA e à agressão sofrida pelo Líbano, na conjectura mundial actual, necessita, tendo em conta o plano metodológico, de usar antes de mais todos os recursos da razão e da diplomacia e, no quadro das acções de legítima defesa, de fazer prova de estratégia e do respeito pelos Direitos Humanos.

Sobre o plano de fundo, a democratização das nossas sociedades e a aposta na secularização, sem perdermos as nossas marcas de referência, são estes a via para revelarmos os desafios. Tanto mais que, o objectivo das forças ocupantes, é o de destruir a vontade de resistir dos povos, de modo a aniquilarem os ferrolhos que se opõem à hegemonia imperial mundial. Esta encontra-se condenada ao fracasso. Não apenas pelos homens da guerrilha, os quais lutam por uma causa justa e no seu território, que são mais fortes, mas também por ser impossível mudar a consciência dos povos. Eles sabem o que é viver uma situação terrivelmente injusta. A história dos povos reza que nada e ninguém no Mundo conseguirá vencer a resistência: nem os Exércitos sofisticados, e nem centenas de anos de repressão.

Contudo, caso todos aqueles que amam a paz e a justiça não se aliarem, de modo a recusarem os comportamentos desviantes, venham estes de onde vierem, desde a desumanização e o “tudo sob controlo”, às reminiscências fascistas, estes comportamentos proliferarão, um pouco por todo o Mundo, sob as formas mais insidiosas. Dois ou três soldados Israelitas capturados em território Libanês ocupado…foi este o pretexto para que um verdadeiro dilúvio se abatesse sobre todo um país …, para além de ter causado o maior desastre ambiental no Mar Mediterrâneo, em todos os tempos.

Os meios de comunicação em massa que dominam o Mundo negam que o Exército Israelita está a ocupar por meio da violência os territórios Palestinianos e que tenha violado o território Libanês. Os discursos invertem a ordem das coisas e afirmam ter sido os resistentes Árabes a ter violado a soberania Israelita.

Quantos mais mortos Palestinianos, Libaneses e Israelitas serão necessários para que o Mundo reconheça os factos? Todos nós somos seres humanos, Judeus e Palestinianos, Orientais e Ocidentais. É chegado o momento de contarmos os mortos e os prisioneiros da mesma maneira. O futuro do Mundo joga-se no Médio Oriente e depende igualmente de nós.

Há imensas fotografias que jamais serão vistas nas páginas de jornais ocidentais: bebés decapitados e mulheres sem pernas ou braços, ou anciãos despedaçados. As incursões aéreas israelitas são promíscuas – quando se enxergam os resultados como temos visto- e obscenas. Sem dúvida, as poucas vítimas igualmente inocentes do Hezbollah em Israel terão, provavelmente, o mesmo aspecto, mas a matança em Gaza e no Líbano é de uma magnitude muito mais terrível.

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Carta aos cineastas Palestinos e Libaneses

24/7/2006 – in ICARABE
Na ocasião da abertura da Bienal do Cinema Árabe em Paris (22 de julho de 2006)

Nós, cineastas Israelitas, saudamos todos os cineastas árabes reunidos em Paris para participar da BIENAL DO CINEMA ÁRABE. Por vosso intermédio, queremos enviar uma mensagem de amizade e solidariedade aos nossos colegas Libaneses e Palestinos que estão, actualmente, acossados e sendo bombardeados pelo exército de nosso país.

Nós somos categoricamente contra a brutalidade e a crueldade da política israelita, intensificadas ao máximo nas últimas semanas”. Nada pode justificar a continuidade da ocupação militar, do cerco e da repressão na Palestina. Nada pode justicar o bombardeio de populações civis e a destruição das infraestruturas no Líbano e na Faixa de Gaza.

Permitam-nos dizer-vos que os vossos filmes, aos quais fazemos tudo para assistir e circular entre nós, são muito importantes para os nossos olhos. Esses filmes nos ajudam a conhecer-vos e a comprender-vos. Graças a esses filmes, os homens, as mulheres e as crianças – que sofrem em Gaza, em Beirute e em todos os lugares em que o nosso exército exerce a sua violência – , têm, para nós, nomes e rostos. Queremos agradecer-lvos por terem feito esses filmes. E também encorajar-vos a continuar a filmar, apesar de todas as dificuldades.

No que diz respeito ao nosso trabalho, mantemos o compromisso de expressar – por meio de filmes, de acções pessoais e de voz elevada – ,a nossa oposição categórica à ocupação militar israelita. E de expressar também o nosso desejo de liberdade, justiça e igualdade para os povos da região.

Nurith Aviv / Ilil Alexander / Adi Arbel / Yael Bartana / Philippe Bellaiche / Simone Bitton / Michale Boganim / Amit Breuer / Shai Carmeli-Pollack / Sami S. Chetrit / Danae Elon / Anat Even / Jack Faber / Avner Fainguelernt / Ari Folman / Gali Gold / BZ Goldberg / Sharon Hamou / Amir Harel / Avraham Heffner / Rachel Leah Jones / Dalia Karpel / Avi Kleinberger / Elonor Kowarsky / Edna Kowarsky / Philippa Kowarsky / Ram Loevi / Avi Mograbi / Jud Neeman / David Ofek / Iris Rubin / Abraham Segal / Nurith Shareth / Julie Shlez / Eyal Sivan / Yael Shavit / Eran Torbiner / Osnat Trabelsi / Daniel Waxman / Keren Yedaya

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Carta aberta e fraterna ao irmão Papa Bento XVI

Coord. por Yiossuf Adamgy

 

Em nome de Deus, Clemente e Misericordioso

 

– “Ó humanidade! Na verdade, Nós vos criamos de macho e fêmea e vos dividimos em tribos e nações, para que se conheçam uns aos outros” (Alcorão, Sura 49 vers.13), na base da justiça, que é uma boa e frutífera palavra: “Como a árvore nobre, cuja raiz está profundamente firme, e cujos ramos se elevam até ao céu.” (Alcorão, Sura 14 vers. 24).

 

– “Deixemos que a divisa do diálogo civilizacional seja o vers. 83 do Cap 2 do Alcorão que diz: “Falai com brandura a todas as pessoas”, e deixemos que a finalidade do diálogo seja a de adquirir a liberdade tão vasta como o universo.

 

“Diz: Todos agem de acordo com a sua própria disposição. Mas o teu Senhor sabe melhor quem é e está Melhor guiado no caminho.” (Sura 17 vers. 4).

 

“Diz: … O teu dever é proclamar a Mensagem.” (Sura 3 vers. 20).”

 

“Para Nós será o regresso deles. Então caberá a Nós chamá-los para as contas.” (Sura 88 vers. 26).

 

“Não há compulsão na religião.” (Sura 2 vers. 256).

 

Com a nossa saudação fraternal, maior respeito e consideração.

 

Querido irmão Bento:

 

Permita-me que o trate assim, como um irmão mais velho. Esta liberdade de escolha é, creio eu, facultada dentro do quadro de dois piedosos princípios: primeiro, há o facto de todos nós sermos membros da raça humana, em todos os continentes e em todas as épocas, no tempo. Descendemos de Adão que foi criado da lama; assim, todos são irmãos e irmãs e o homem é irmão do homem, quer queira quer não. Em segundo lugar, o reconhecimento mútuo e a amizade (não a matança mútua, o ódio e a vingança) são os termos Islâmicos para o diálogo intercivilizacional e intercultural:

 

Dizia eu, então, querido irmão Bento. Indubitavelmente que sabes que, enquanto Muçulmanos, a nossa ascendência na Fé remonta ao nosso pai comum, o Profeta Abraão, pai de Ismael e de Isaac (a paz esteja com eles), e que fazemos parte desse mesmo universo luminoso de crentes que Deus lhe prometeu como descendência.Então, levou-o para fora e disse-lhe: ‘Olha para o céu e conta as estrelas, se é que as consegues contar’. E disse-lhe: ‘Assim será a tua descendência’ (Génesis, 15, 5). Irmão, nós, os Muçulmanos, assim como toda a Humanidade, esperamos muito de ti. Esperamos a tua contribuição clara, decidida e decisiva, para a neutralização da infinidade de bombas de ódio, prontas a serem activadas nos arsenais mentais das pessoas mais afastadas da espiritualidade e da transcendência, tanto a Oriente como a Ocidente.

 

É pela posição que ocupas e responsabilidade que tens perante o ser humano, e especialmente perante o universo de crentes prometido a Abraão, que verificámos que a tua lição de Teologia do outro dia, proferida na Universidade de Ratisbona – Alemanha, não foi uma das mais bem sucedidas e nem correctas.

 

Tratou-se de uma apresentação académica, visto que, acima de mais, és um erudito em teologia. Se era tua a intenção de desafiar os sábios Muçulmanos para uma discussão acerca dos méritos e desméritos de ambas as religiões em termos de fé e de razão, qualquer erudito Muçulmano de terceiro nível estaria disposto a aceitá-lo. Contudo, e em primeiro lugar, terias que abdicar do seu posto e voltar a ser um académico. Na História contemporânea, nunca os Papas cederam às discussões inter-religiosas. Pelo menos, os três últimos Papas tinham consciência do Mundo e ordenavam o respeito para com as religiões.

 

Foi uma lição maculada pela irresponsabilidade e pela indolência, que fomenta uma visão trivial e frívola do Islão, que favorece o confronto entre crentes e que se submete servilmente ao jogo dos terroristas e dos poderes, ditos democráticos, que não hesitam em assassinar milhares de inocentes, violar todo um conjunto de resoluções, invadir impunemente os países ou desalojar milhões de pessoas, deixando-as sem casa e sem história, em nome de uma ideia de Deus, liberdade ou Democracia, que não correspondem e não se harmonizam com os valores que emanam de um Deus Misericordioso e Compassivo. Democracia, que hoje está em conflito com as democracias reais, só o será, como definiu Rousseau, “quando, numa sociedade, ninguém for tão rico que possa comprar alguém e ninguém seja tão pobre que tenha de se vender a alguém”.

 

No momento em que redigimos esta carta, é-nos possível ler títulos onde a tua própria segurança é já posta em causa. Sentimos que foste induzido pelos obscuros poderes dominantes do Mundo a trespassar esta linha vermelha que, do nosso ponto de vista, não devias nunca ter passado, e receamos que a utilização da tua elevada pessoa e posição sejam mesmo manipuladas ao mais dramático extremo. Um sangrento ataque contra a Igreja representaria uma excelente desculpa e um perfeito álibi para legitimar, sem necessidade de mais nada, o progressivo e definitivo extermínio da fé unitária.

 

Tu, irmão Bento, precisas sinceramente reflectir se, com tal declaração, estás a ser um nobre defensor da Verdade, se estás a ser o favorecedor evidente da Paz que todos esperamos que sejas, e para o qual também nós, fiéis Muçulmanos, dirigimos o nosso olhar.

 

Tens que ter consciência que já recentemente se fez uso do Islão para um confronto entre os crentes. E há que recordar o martírio dos irmãos cistercienses de Tibhirine. Assassinato este, no qual existem suspeitas da autoria real dever-se aos serviços secretos de um país Europeu de marcada tradição colonialista na zona.

 

Voltamo-nos também para ti, porque acreditamos na bondade da mensagem de nosso Jesus (a paz esteja com ele). Não te admires por nos referirmos a ele com tais palavras, pois é assim que as mães Muçulmanas ensinam os seus filhos a chamar a Jesus: “Este é Jesus, filho de Maria, é a pura verdade, da qual duvidam” (Alcorão 19, 34).

 

Como vês, para nós, Jesus também é ‘palavra’, é a pronunciação viva da Verdade. É ele quem na Revelação contribui com o conceito da Ternura de Deus. Jesus é ‘al Ruh al Qudus’, o Espírito da Santidade…Jesus é tão vosso como nosso, é ele quem nos une, se é que aquilo que verdadeiramente queremos é a união e a Paz.

 

Quanto à tua suposição de que o Cristianismo é o produto da síntese entre a fé do Velho Testamento e a filosofia Grega da razão, estás a separar o Cristianismo da sua origem Hebraica, ocidentalizando-o e revelando, uma vez mais, o teu sectarismo Europeu. Surpreende-nos que, em lugar de dares valor à razão, queiras roubar o significado que tem o semitismo da pessoa de Jesus. Jesus era Aramaico, o Aramaico é a língua materna de Jesus e com o esquema mental que forma a língua materna semítica é que se dirige e relaciona com Deus. O próprio Paulo o recorda na sua carta aos Romanos, quando refere que ‘…recebestes um espírito de adopção pelo qual chamamos:’Abba, Pai!” (Romanos, 8: 15).

 

Acreditamos sinceramente que devolver o Novo Testamento ao estudo pré-grego acentuaria as extraordinárias semelhanças existentes entre a mensagem de Jesus e o Islão. Evitar isso seria o mesmo que dissimular a natureza semítica de Jesus, um acto que não apenas serve para aprofundar a distância entre os crentes, mas também que acabará por supor que o Cristianismo perde não apenas a Deus (Pai), com O Qual encerrou já o acesso devido às desnecessárias intermediações impostas pelo Cristianismo, mas que a perda será ainda mais terrível, ou seja, é o verdadeiro Jesus quem acabará desprovido da transcendência e, portanto, da Revelação, acabando transformado num ‘ídolo da razão’, o que converterá definitivamente a vossa crença numa religião materialista. A nossa proposta é a de que vos volteis para a oração de Jesus: ‘Pai Nosso…’, ‘Abbá…’ Que grave perda foi para o Cristianismo cimentar a teologia à margem da oração de Jesus e viver em permanente contradição!

 

Qual é o conflito entre a razão e a transcendência? Acreditamos que a tua aula apresenta algum desacordo relativamente a este tema, apesar do mestre de Tomás de Aquino ter sido um Muçulmano Hispânico, Averróes.

 

Baseias toda a Dogmática no ‘mistério’. A transubstanciação é um mistério, todos os sacramentos são um mistério, a Virgindade de Maria é um mistério, a concepção de Maria é um mistério, a humanidade e a divindade de Jesus, perfeitamente equilibradas, são um mistério, a Trindade…é um mistério. Nós partilhamos convosco alguns desses mistérios, especialmente no que se refere a Maria; contudo, como nos explicareis a Trindade com a razão? Como se pode explicar o mistério do amor de Deus tendo a razão como única arma? Como podeis explicar todos os mistérios da fé católica, a não ser recorrendo a um Deus transcendente? É possível medir Deus? Nem mesmo o rosto humano de Deus poderia ter explicação, se é que a tem, sem um Deus transcendente.

 

Por último, dizes ‘que o Islão se propagou pela espada’.

 

Na realidade, acreditamos que o fazes para esconder a tua profunda admiração para com a nossa fé, para com a nossa adoração perseverante e intensa. Uma fé inquebrável, que faz com te perguntes, sem encontrar respostas convincentes, porque são tão poucos os Muçulmanos que se convertem ao Cristianismo, e tantos e tantos aqueles que, depois de terem sido Cristãos praticantes, reconhecem no Islão a nossa própria constituição enquanto seres humanos, o nosso lugar no Cosmos. A verdade é que custa, quando se é Cristão, ver como as Mesquitas estão cheias todas as sextas-feiras, de homens e de mulheres de todas as idades, com as frontes junto ao solo, prostradas na mais sincera atitude de aceitação da vontade de Deus. O que chama especialmente a atenção é que estes participantes são sobretudo homens, sendo que a sua grande maioria é composta por jovens. E as Igrejas encontram-se vazias, apenas as mulheres, especialmente as já de idade, poucas ainda com um véu ou lenço na cabeça, rezam, espalhadas pelos bancos solitários. É duro. Sabem-no muito bem, aqueles que entre nós, que já foram Católicos e que durante muitos anos serviram à Igreja. É lamentável, inclusive, que os dois únicos jejuns obrigatórios da Igreja (a pão e água) sejam cumpridos por tão poucos paroquianos, enquanto que mais de 1500 milhões de pessoas fazem um jejum total, de sol a sol, durante os abençoados trinta dias do Ramadão, mês mais sagrado do Islão, que irá entrar dentro de três dias. A pergunta que possivelmente deverias fazer é a seguinte: o que há no interior dos corações desses crentes? Fanatismo…ou a pura e simples experiência de Deus?

 

É possível que, 1400 anos depois das supostas conquistas Islâmicas, quem tenha professado a fé pela espada, continue hoje a fazê-lo com este imenso fervor? O único lugar do mundo Islâmico onde não foi possível prosseguir com estas impressionantes demonstrações de amor a Deus, foi na Espanha Andaluza, pois aí teve lugar um genocídio religioso brutal, cometido por Católicos contra Muçulmanos e Judeus por meio da espada, muito mais forte, violento e sanguinário. Uma espada que se ergue de novo, e cuja sombra não deveria confundir-se com a cruz de Nosso amado Jesus, filho de Maria.

 

Diz-se e lê-se por aí que o “Papa sabe que uma guerra religiosa é uma maneira excelente de recuperar o Cristianismo. O Islão radical está a dar-lhe uma oportunidade. As desculpas são apenas poeira para os olhos. E preciso reunir os rebanhos quando os lobos andam por perto, e o pastor sabe disso…”. Espero e apelo que não deixes que, isso que se diz e se lê, se torne verdade verdadeira.

 

Irmão Bento, não receies o Deus transcendente que adoramos. Não receies o abismo. Se de facto a tua fé é um acto de confiança plena, saltarás, sem duvidar, no vazio do Deus Único. Reflecte e medita se talvez a vossa fé não é uma fé presente e tomada, em que, por um impulso da natural debilidade humana permanecereis na borda do precipício, refugiados na imagem humana de Deus, da qual conseguis a segurança que vos falta para que vos entregueis plenamente a Ele.

 

A nossa fé, salvaguardadas pequenas diferenças, assemelha-se à de Francisco de Assis, João da Cruz ou Teresa de Ávila, todos eles justos e conhecedores da tradição espiritual Islâmica chamada sufismo, praticantes de uma fé despojada, numa fé que se eleva no bonito salto no vazio da imensidão de Deus para conhecer por fim que apenas Deus basta, que apenas Deus existe, que apenas Allah existe…

 

Porque recear então?

 

Allah ama-te, irmão Bento.

Que a Sua Misericórdia derrame abundantemente sobre ti e sobre a Igreja. E, da nossa parte, Paz.

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Carta de Jean-Moise Braitberg

Jean-Moise Braitberg

Escritor judeu, ao presidente de Israel
Apaguem o nome do meu avô em Yad Vashem

Nesta carta ao presidente de Israel, Jean-Moise Braitberg, escritor judeu, a quem foi assassinado o avô em Treblinka, deportado com outros familiares em campos de concentração pede ao presidente de Israel que retire o nome dos seus familiares do Memorial em Israel, dedicado à memória das vítimas judias do nazismo.

Senhor Presidente do Estado de Israel

Escrevo-lhe pedindo-lhe que intervenha junto de quem de direito, para que seja retirado do Memorial de Yad Vashem, dedicado à memória das vítimas judias do nazismo, o nome do meu avô, Moshe Brajtberg, gaseado em Treblinka em 1943, assim como os dos outros membros da minha família mortos na deportação em diferentes campos nazis durante a II Guerra Mundial. Peço-lhe que atenda o meu pedido, senhor presidente, porque o que se passou em Gaza e dum modo geral, a sorte reservada ao povo árabe da Palestina desde há sessenta anos, a meu ver, desqualifica Israel como centro da memória do mal feito aos judeus, e portanto, a toda a Humanidade.

Veja, vivi desde a minha infância rodeado de sobreviventes dos campos da morte. Vi os números tatuados nos braços, ouvi os relatos das torturas; conheci os lutos impossíveis e partilhei os seus pesadelos.

Ensinaram-me que é necessário que estes crimes jamais se repitam; que jamais um homem, sentindo-se superior pela sua pertença a uma etnia ou a uma religião, despreze outro, o ultraje nos seus direitos mais elementares, que são uma vida digna em segurança, a ausência de entraves, e a esperança, por mais longínqua que seja, dum futuro de serenidade e de prosperidade.

Ora, senhor presidente, observo que, apesar das muitas dezenas de resoluções decididas pela comunidade internacional, apesar da gritante evidência da injustiça cometida contra o povo palestiniano desde 1948, apesar das esperanças nascidas em Oslo e apesar do reconhecimento do direito dos judeus israelitas a viver em paz e segurança, muitas vezes reafirmado pela Autoridade palestiniana, as únicas respostas dos sucessivos governos do seu país têm sido a violência, o sangue derramado, o encarceramento, os controlos incessantes, a colonização, as espoliações.

Dir-me-á, senhor presidente, que é legítimo, ao seu país, defender-se contra os que lançam roquetes sobre Israel, ou contra os kamikazes que arrastam consigo nu

merosas vidas israelitas inocentes. A isto responder-lhe-ei que o meu sentimento de humanidade não varia conforme a nacionalidade das vítimas.

Pelo contrário, senhor presidente, o senhor dirige os destinos de um país que pretende, não só representar todos os judeus, mas também a memória dos que foram vítimas do nazismo. Isso é que me diz respeito e que me é insuportável. Mantendo no Memorial de Yad Vashem, no coração do Estado judeu, o nome dos meus próximos, o seu Estado retém a minha memória familiar prisioneira detrás do arame farpado do sionismo, para a tornar refém de uma pretensa autoridade moral que comete todos os dias a abominação que é a negação de justiça [1]

Assim sendo, faça o favor de retirar o nome do meu avô do santuário dedicado à crueldade feita aos judeus, de modo que não sirva para continuar a justificar a que é feita aos palestinianos.

Queira aceitar, senhor presidente, a minha respeitosa consideração.

Notas:

[1] No original “déni de justice”, que na língua francesa tem o significado de recusa, pelo Juiz ou pelo Tribunal, de realizar o acto de justiça, que é parte integrante da sua função (N.T.)