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O 30º. Aniversário da Revista Al Furqán

Al Furqán

Prezados Irmãos, Assalamu Alaikum:

No dia vinte e um de Abril, corrente, esta Revista Islâmica Portuguesa, independente, completou o seu 30º. Aniversário e, no dia seguinte, entrou no trigésimo primeiro.

TRINTA ANOS de existência! Louvado seja Deus!

Trinta anos de trabalho intensamente árduos, com muita fé, com muito equilíbrio, enfrentados vários contratempos, dificuldades financeiras, algumas invejas e até má vontades.

Mas dou graças a Deus, pois ao longo deste período de tempo, a coberto do meu ideal de honra e de dever Islâmico no que respeita à informação, divulgação e defesa do Islão, consegui mobilizar a minha modesta força moral e voluntária, colocando-me ao serviço do Islão, esforçando-me no sentido de garantir continuidade regular dos números desta Revista e das actividades e incentivos ligados à cultura Islâmica.

Todavia, e apesar das vicissitudes, existência saborosa porque as compensações têm sido muitas, quer as que me chegam de gente não muçulmana consubstanciada nos pedidos de assinatura da revista, de livros, de respostas às perguntas, quer as que me são dadas pelos irmãos em dádivas de dinheiro, desde o início da fundação da revista Al Furqán, e cuja contabilidade, em síntese, é apresentada em cada número editado. A todos os meus sinceros agradecimentos. Que Allah os recompense.

Congratulo-me, pois, por Al Furqán ter conquistado lugar de relevo ao cabo destes 30 anos de sacrificada existência. Lugar de relevo esse alcançado mercê das numerosas obras editadas, cerca de 180, incluindo as primeiras dez partes publicadas da Tradução Portuguesa do Alcorão, com notas. De mencionar, também, a edição da Feira Anual do Livro Islâmico em Portugal, desde 1994 e da primeira página islâmica portuguesa na Internet, desde 1996.

Por consequência, não se podia deixar passar em branco esta data festiva, nem se pode deixar de rogar a Deus que nos continue a ajudar a manter a Revista e as suas obras como fonte perene de divulgação do Islão em Portugal.

Que Allah se digne orientar-nos na senda correcta.

Mahomed Yiossuf Mohamed, Director

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Alcorão: Um Livro Perseguido

História – 15/04/2011 – Autor: Fernando Báez* Versão portuguesa: Al Furqán
(Fonte: http://www.elciudadano.cl/2011/04/12/el-coran-un-libro-perseguido/?TB_iframe=true&height=500&width=940)
* (Fernando Báez é historiador e autor do livro “História Universal da Destruição dos Livros”)

“Ali onde queimam livros, acabam queimando pessoas… “

Em Agosto de 2010, os membros ortodoxos de uma pequena e desconhecida igreja cristã da Florida anunciaram, com alguma timidez inicial que rapidamente se converteu em ousadia, que pretendiam queimar milhares de exemplares do Alcorão. A sua intenção era transformar a data de 11 de Setembro, no dia Mundial da Destruição de qualquer obra Islâmica. Parecendo um objectivo pobre, os agentes da polícia pensaram que seria apenas só mais uma ameaça, até que conheceram Terry Jones, pastor que conduzia esta fanática iniciativa.

Jones, dotado de farto bigode, sobrancelhas cerradas, um olhar perdido e pouco eruditos conhecimentos bíblicos, despertou em alguns esse excêntrico sentimento que só o ressentimento e o desejo de vingança podem nutrir, e esta sua persona enquadrou-se perfeitamente na encarnação desse personagem odiado, xenófobo e radical nas suas próprias ambiguidades. Como uma versão controversa dirigida por Quentin Tarantino do polémico Pat Robertson.

Para se manter actualizado através dos novos meios de Comunicação Social, a seita de Jones criou um Link no Facebook, com o nome de ‘International Burn a Quran Day’ onde convidava os seus fiéis a colaborar na fogueira que acenderia nesse dia, em Gainesville, entre as 6 e as 9 horas da tarde. O grupo trouxe um contentor pintado de branco, com letras vermelhas, onde se repetia a mensagem e, como se não bastasse, foram criados cartazes de propaganda, não se escondendo a presença de armas e símbolos nefastos.

O público, céptico e habituado a discursos intermináveis sobre o fim do mundo, não o levou a sério até à reacção oficial de líderes políticos, religiosos e militares.

Um reverendo anónimo como Jones foi então chamado por Robert Gates, director da CIA; pelo mítico General David Petraeus, que comanda as tropas no Afeganistão; e ainda por uma sucessão interminável de policias locais e federais. A 11 de Setembro, data marcada, acabou por não acontecer nada, mas Jones não se rendeu, e a 20 de Março de 2011 decidiu voltar à sua missão, ordenando ao seu assistente que queimasse esse livro que considerava prejudicial para o mundo. Dois dias mais tarde, a notícia provocou a explosão de um edifício da ONU, que fez 12 mortos. Sabe-se hoje que, desde esta “fogueira americana”, já aconteceram pelo menos mais oito atentados com explosivos.

Esta é, provavelmente, uma história patética, no entanto revela a sua tragédia intrínseca no número incontável de vezes que este incidente já ocorreu com consequências amargas. Heinrich Heine, por exemplo, escreveu em Almansor (1821): “Ali onde queimam livros, acabam queimando homens”. A frase é bastante citada, o que por acaso se deixa esquecido de parte (não sei se por má-fé), é que se refere efectivamente à queima do Alcorão na cidade de Granada.

Condenado à fogueira histórica

Em 1500, um austero padre, chamado Francisco Jiménez de Cisneros, ordenou aos seus fiéis que reunissem toda e qualquer edição de livros árabes, em especial do Alcorão, e decidiu que estes seriam submetidos à visão implacável das chamas. Mais de 5.000 volumes foram queimados. Mas este sacerdote, quiçá em singular acaso, passou para a história como o nobre fundador da Universidade de Alcalá.
Durante a captura de Tripoli, em 1109, os cruzados procuraram todos os exemplares possíveis do Alcorão para queimar. Acreditavam que esta era uma obra do mal e que merecia o fogo. Ainda assim, uma misteriosa edição de 1537 foi destruída por instrução directa do Papa. Até então acreditava-se que não havia restado nenhuma cópia, mas na verdade havia uma única no mundo, descoberta por Angela Nuovo, na Biblioteca dos Frades Menores de S. Michele, na Ilha de Isola, em Veneza. Este podia ser um dos livros mais raros da história.

A 11 de Junho de 1992 foi anunciada a execução de quatro pessoas na cidade santa de Mashhad, na província de Khorasan. Os seus nomes eram: Javad Ganjkhanlou, Golamhos-sein Pourshirzad, Ali Sadeqi e Hamid Javid. Todos eles foram detidos em Mashhad, no dia 30 de Maio de 1992, em consequência dos distúrbios ocorridos naquela cidade. Consideraram-se culpados e foram condenados por várias acusações, mas Ali Sadaqi foi ainda acusado de queimar milhares de exemplares do Alcorão, pois era ele o chefe no ataque contra o edifício da Organização da Propagação Islâmica, onde ardeu, em consequência, uma enorme biblioteca.

Acredita-se que entre 1992 e o fim da guerra, os sérvios danificaram cerca de 188 bibliotecas: 43 foram totalmente destruídas e 1.200 mesquitas foram devastadas, sendo esta uma contagem ainda incompleta. Milhares de exemplares do Alcorão foram desta forma purgados e assim desapareceram.
Em 1998, um livreiro francês, de cujo nome não se quer recordar a Comunicação Social Europeia, foi condenado a pena suspensa de dois anos por destruir livros Muçulmanos e Árabes numa Biblioteca Municipal em Paris. Este fanático escondia todos os livros Árabes que encontrava, e depois levava-os para casa, onde os queimava para que ninguém os pudesse ler.

Porquê destruir o Alcorão? Porquê tanto ódio para um Livro?

Numa tentativa de entender o que se passa, talvez se deva assinalar que este ataque responde ao significado cultural e religioso do que ali está escrito. O Islamismo, com 1.300 milhões de seguidores, transformou o mundo árabe com uma mensagem que se mantém bem viva: “Não há outra divindade senão Deus (ár. Allah), e Maomé (ár. Muhammad) é o Seu Profeta”. Conta a história que o anjo Gabriel revelou durante 23 anos uma série de regras a Maomé, que viriam a tomar forma de Livro no Alcorão. Um conjunto de 114 “suras” ou capítulos, com mais de 6.000 versículos. Com os anos esta obra, cujo nome alude à recitação assim efectuada pelo anjo, seria tornada sagrada e considerada de diferentes formas pelos Muçulmanos.

Basta dizer que é impossível recitar o Texto, sem que se seja purificado. O Livro é cuidadosamente envolto em seda ou em tela adornada, e é colocado numa posição elevada. A maior glória dos muçulmanos é a memorização destes textos. Os que o conseguem ganham o título de “Hafiz”.

Acredita-se que, recitando certa maneira, produz milagres. A perfeição da caligrafia com que é escrito pressupõe quase um acto piedoso, e antes de ser transcrito por Zhaid ibn Thabit, esteve presente em folhas de palmeira, ossos planificados de camelo, pedaços de madeira e pergaminho.

Não é possível que o leitor já tenha ouvido falar de um computador ou um carro sagrado, mas sabe (como soube Borges), de livros considerados sagrados. O livro torna-se para muitas sociedades, para além de um monumento à memória, uma manifestação divina de um espírito superior, como o põem em evidência os 56 túneis da montanha de Chiltan, na comunidade de Quetta, no Paquistão, que um grupo de servidores habita ainda hoje, para guardar um cemitério onde subsistem 70.000 bolsas que protegem exemplares danificados do Alcorão. Estes depósitos são chamados de Jabal-E-Noor-Ul-Quran.
E ainda, enquanto Livro Sagrado, o Alcorão toma paradoxalmente outra condição, ao ser um Livro perseguido enquanto símbolo. Os que hoje o queimam sabem o que fazem. Assim como os seus antecessores, tentam provocar o conflito religioso mais feroz do Séc. XXI entre o Ocidente e o Médio Oriente.

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Banca Islâmica, a Banca Halal (Lícita)

Por: Vicente Sansano – Fonte: Webislam
Versão portuguesa: AlFurqán, nº. 181, de Maio/Junho.2011

O Doutorado em economia, Ernst. F. Schumacher, recolheu para no seu livro “O Pequeno é Belo”, a seguinte citação “A saúde espiritual e bem-estar material não são inimigos, mas sim aliados naturais”. O Oriente sabe que a matéria e o espírito são as extremidades de uma mesma linha, enquanto no Oeste são linhas de trabalho completamente distintas e independentes entre si.

O Ocidente criou uma economia sem consciência, uma economia violenta, que ataca a natureza e o ser humano, uma economia hipertrófica que está nos seus limites. Se este Titanic em processo de colisão não corrigir o rumo desenfreado que leva, acabará, como temos vindo a presenciar nos últimos dois anos, por colidir definitivamente contra a sua própria criação, sendo engolido por ela.

Os bancos, grandes responsáveis e elementos participativos deste sistema económico, são um reflexo fidedigno do que aqui dizemos, pois o seu objectivo é apenas maximizar os seus lucros e benefícios, e fazer com que estes sejam cada vez maiores, de ano para ano. Mas, nesta corrida que parece não ter fim, eles esqueceram-se de que não há nada no mundo, nem em todo o universo, que possa ter um crescimento contínuo, sempre em linha recta para cima até o infinito, pois tudo o que sobe, desce, assim como a noite segue o dia e a maré baixa segue a maré alta. O que acontece, o que está a acontecer neste momento, não é mais que um novo aviso perante esta ambição desmedida de um sistema financeiro especulativo, ganancioso e ao estilo do de casino.

É neste cenário de turbulência financeira e económica, que o sistema bancário islâmico tem algo a dizer, oferecendo uma alternativa à banca tradicional que temos vindo a conhecer até agora em Espanha. Não com intenção de a substituir, mas sim de dar uma outra oportunidade ao cidadão, seja ele muçulmano ou não, e às empresas que assim o desejarem, de poderem tomar uma opção diferente, com ética, transparente e responsável no que toca ao conjunto da sociedade.

Quando falamos em finanças islâmicas, estamos a referir-nos tacitamente, da banca halal, pois na realidade não podem ser dissociadas uma da outra. Isso significa que há normas a serem cumpridas, e regras e princípios éticos a serem respeitados, de acordo com a forma com que a ética Islâmica tem de compreender o mundo, em geral, e na área de finanças, em particular.

Desta forma, existem alguns princípios básicos que devem ficar claros desde o início, sem os quais este tipo de finanças não pode ser considerado islâmica ou halal. Não são autorizados investimentos em indústrias que a Charia entenda como prejudiciais para a comunidade, como as relacionadas com armas, álcool, tabaco, pornografia ou as dos mercados de carne de porco. Todos estes sectores são considerados haram. O Alcorão diz em 2:275: “Allah tornou lícito o comércio e proibiu a usura”. Ditou, desta forma, a proibição de juros, denominada de usura; e aqui é necessária uma clarificação semântica, pois tal como é entendida pelo sistema bancário ocidental, a usura é a definição de um interesse abusivo, enquanto no Islão, a usura é juro, por menor que este seja. A especulação não é permitida, pois o dinheiro é um meio e não um activo em si mesmo, e, portanto, para obter qualquer benefício monetário, o dinheiro tem de estar necessariamente vinculado ao trabalho. Desta forma é fácil concluir que no Islão, o desenvolvimento económico é uma relação entre capital e trabalho.

De acordo com o que foi dito anteriormente, surge imediatamente a seguinte pergunta: “se me dirigir a um banco islâmico e pedir um empréstimo, dão-mo sem que tenha de pagar nada mais que o capital que me for emprestado?”. Obviamente a resposta é não, pois mesmo os bancos islâmicos têm necessidade de obter retorno sobre o valor dos seus serviços, caso contrário a sua existência não seria possível. Então, onde está a diferença? O que o sistema bancário islâmico faz, é cobrar uma taxa fixa, pré-estabelecida, e não abusiva, como pagamento do serviço prestado. Se pretendemos adquirir um bem ou serviço, o banco compra-o para então o vender a um preço superior, e quem o pretenda adquirir paga o seu novo valor, diferido no tempo. Se pretendermos utilizar esse bem durante um determinado espaço de tempo determinado, o que o banco faz então é adquiri-lo e imediatamente alugá-lo a nós, determinando, antecipadamente, o montante das contribuições e o período de tempo durante as quais ocorrerão, isto é, durante o período que acreditamos que esta propriedade será necessária para uso ou lazer, o que será algo semelhante ao que nos bancos ocidentais é conhecido como leasing. Outra forma de aceder ao capital do banco é quando queremos montar um negócio, neste caso o que o banco faz é tornar-se nosso sócio, entrando participativamente como accionista da empresa, no total, ou em parte do risco envolvido, obtendo por seu turno benefícios e lucros quando os hajam e suportando perdas caso o negócio não seja lucrativo e estas ocorram.

Existe um elemento comum em todos estes exemplos que estamos a dar, pois o banco, contrariamente ao que estamos habituados, partilha o risco com o seu cliente. Pode ganhar, mas também pode perder, situação que não ocorre com os bancos tradicionais, onde este sempre sai com ganhos e nunca com perdas de capital.

Do que conhecemos, os empréstimos bancários são destinados àquelas pessoas que têm património próprio, porém nunca àquelas que têm boas e viáveis ideias de negócios, mas que carecem de capital. A estas últimas, a banca islâmica também pode dar crédito.

O sistema que a banca tradicional tem para garantir o reembolso do capital emprestado compromete os bens do devedor, os quais são por norma num valor muito superior ao valor do empréstimo solicitado. Ou seja, o resultado é sempre a celebração de contrato predatório, mas, paradoxalmente, legal e socialmente aceite. Se as coisas correrem mal, o devedor perde tudo. Relativamente a esta situação Marck Twain disse: “um banqueiro é alguém que, quando o sol brilha deixa um guarda-chuva; quando começa a chover retira-o”.

Em contrapartida, os bancos islâmicos, ao partilharem os riscos, e ao participarem na conta de ganhos e perdas, tornam o sistema económico-financeiro muito mais justo e equitativo. Por conseguinte o sistema bancário com base no interesse o que faz é ampliar as desigualdades sociais, contrariamente ao sistema bancário islâmico, que é muito mais equilibrado e responsável, uma vez que também se envolve no sucesso empresarial e de gestão, pois se o mutuário perde o banco também perde. De tudo isto, podemos deduzir que os empreendimentos levados a cabo com apoio de financiamento islâmico têm mais probabilidades de chegar a bom porto.

Como já mencionado, outra das diferenças substanciais no sistema bancário islâmico é a ausência de especulação financeira e, portanto, toda a actividade económica está focada na economia real, dando lugar à criação de capital para empresas e postos de trabalho. O que gera mais riqueza, mas menos ricos.
O sistema especulativo dos financiamentos tradicionais, o que faz é tornar os preços das matérias-primas e bens mais caros, (moradias, terra, cereais, petróleo, etc.), necessários para a subsistência digna da população do resto do mundo, principalmente aquela que ocupa o hemisfério sul, provocando, dessa forma, o incremento das bolsas de pobreza, promovendo um sistema injusto e desigual, aumentando o fosso entre ricos e pobres.

Outra característica da banca islâmica, é que a dívida não pode ser vendida, não pode mudar de mãos, o risco de a assumir desde o início até o final, tem de ser assumido pelo credor original, ou seja, pelo banco que cedeu os direitos do crédito. Esta prática está totalmente normalizada no sistema bancário que conhecemos e tem sido uma das principais razões que levaram ao colapso do castelo de cartas, à crise sistémica que experienciamos, com a venda de dívidas hipotecárias prime e suprime.

Dissemos que, quando nos referimos à banca islâmica, estamos a referir-nos a uma banca ética e, ainda que a união da banca e ética possa soar como um oximoro, e pareça uma contradição não só aos nossos ouvidos, mas também por experiências pessoais como clientes do sistema bancário que conhece-mos, é no entanto algo realmente possível dentro do sistema da banca islâmica, já que não só se interessam pelo lucro, mas também pelos indivíduos, pela comunidade, detendo um importante interesse social.

Vimos, no sistema bancário islâmico, que o dinheiro dos clientes nunca pode financiar projectos que estejam em desacordo ou vão contra o Islão, tais como a indústria de armamento, a de carne de porco, a da pornografia, etc., mas também não pode ser direccionado para empresas que super-exploram a natureza ou que façam recurso de trabalho infantil. Além disso, o cliente pode decidir a que tipo de investimento se destina o seu dinhei-ro, sabendo, a qualquer momento, qual é a situação do seu capital.

Poderíamos dizer, sem equívoco, que esta forma de trabalhar da banca representa um novo paradigma no que é o sistema financeiro tradicional que conhecemos. É um modelo de investimento socialmente responsável, que cuida não só do capital, mas também da sociedade.

Assim, relativamente ao sistema da usura e da especulação, a única alternativa é a banca ética, no nosso caso, a banca ética islâmica, para superar as injustiças sociais de um capitalismo voraz. (…).

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Carta a Obama

Autor: Adolfo Pérez Esquivel
Fonte: http://www.cubadebate.cu/opinion/2011/05/09/carta-a-obama-de-perez-esquivel/?TB_iframe=true&height=500&width=940

O Prémio Nobel da Paz em 1980, Adolfo Pérez Esquivel (Opinião – 13/05/2011 -)

Estimado Barack:

Ao dirigir-te esta carta, faço-o fraternalmente para, ao mesmo tempo, te expressar a preocupação e a indignação de ver como a destruição e a morte ensombram vários países, em nome da “liberdade e da democra-cia”, duas palavras prostituídas e vazias de conteúdo, que terminam justificando um assassinato que é celebrado como se de um evento desportivo se tratasse.

Indignação pela atitude dos sectores populacionais dos EUA, de chefes de Estado europeus, e de outros países que vieram apoiar o assassinato de Bin Laden, ordenado pelo teu governo e pela tua complacência, em nome de uma pretensa justiça.

Não procuraram detê-lo e julgá-lo pelos crimes alegadamente cometidos, o que gera ainda mais dúvidas, o objectivo foi assassiná-lo.

Os mortos não falam e o medo do executado, que poderia dizer coisas não convenientes para os EUA, resultou no assassinato e na tentativa de assegurar que “morto o cão, terminou a raiva”, sem levar em conta que não fazem outra coisa senão incrementá-la.

Quando te outorgaram o Prémio Nobel da Paz, do qual somos fiéis depositários, enviei-te uma carta que dizia: “Barack, muito me surpreendeu que te tenham outorgado o Nobel da Paz, mas, agora que o recebeste, deves colocá-lo ao serviço da Paz entre os povos, tens todas as possibilidades de o fazer, de terminar as guerras e começar a reverter a situação em que vive o teu país e o mundo”.

No entanto, ao invés disso, incrementaste o ódio e traíste os princípios assumidos na campanha eleitoral perante o teu povo, como colocar um final às guerras no Afeganistão e no Iraque, e fechar as prisões em Guantá-namo e Abu Graib no Iraque. Nada disso lograste fazer, pelo contrário, decides começar outra guerra contra a Líbia, apoiada pela NATO e pela vergonhosa resolução das Nações Unidas em apoiá-la; quando esse alto organismo, diminuído e sem pensamento próprio, perdeu o rumo e se submete aos caprichos e interesses das potências dominantes.

A base funcional da ONU é a defesa e a promoção da Paz e da Dignidade entre os povos. No seu preâmbulo destaca-se: “Nós, os povos do mundo (…)”, hoje ausentes desse alto organismo.
Quero recordar um místico, e mestre, que tem uma grande influência na minha vida, o monge trapista da Abadia de Getsemaní, no Kentucky, Thomas Merton, que diz: “A maior necessidade dos nossos tempos é limpar a enorme massa de lixo mental que entope as nossas mentes e converte toda a vida política e social numa enfermidade das massas. Sem essa limpeza doméstica não podemos começar a ver. E se não vemos, não podemos pensar”.

Eras muito jovem Barack, durante a guerra do Vietnam, e talvez não te recordes da luta do povo norte-americano contra a guerra.

Os mortos, os feridos e os mutilados no Vietnam sofrem as consequências até aos dias de hoje.
Thomas Merton dizia, frente a um carimbo dos Correios que acabava de chegar ‘The U.S. Army, key to Peace’ (Exército dos EUA, chave da paz): “Nenhum exército é a chave da paz. Nenhuma nação tem a chave de nada que não seja a guerra. O poder não tem nada a ver com a paz. Quanto mais os homens aumentam o poder militar, mais violam a paz e a destroem.”

Partilhei e acompanhei os veteranos da guerra do Vietnam, incluindo Brian Wilson e os seus companheiros, os quais foram vítimas indefesas dessa e de todas as outras guerras.

A vida tem esse não-sei-quê de imprevisto e da surpreendente fragrância e beleza que Deus nos deu para toda a humanidade, e que deve-mos proteger para deixar às gerações futuras uma vida mais justa e fraterna, res-tabelecendo o equilíbrio com a Mãe Terra. Se não agirmos para mudar o actual estado de soberba suicida, que arrasta actualmente os povos a abismos profundos onde a esperança morre, será difícil sair e ver a luz; a humanidade merece um destino melhor.

Sabes que a esperança é como essa flor de Lótus, que cresce no lodo e floresce em todo o seu esplendor mostrando a sua beleza.

Leopoldo Marechal, esse grande escritor argentino, dizia que: “do labirinto, sai-se por cima”.

E creio Barack, que depois de seguires a tua rota errando caminhos, te encontras agora num labirinto do qual não encontras saída, enterrando-te mais e mais na violência, na incerteza, devorado pelo poder da dominação, arrastado por grandes corporações, pelo complexo militar-industrial, e acreditas ter todo o poder e que tudo podes, posto que o mundo está aos pés dos EUA, porque invadem países e impõem a força das armas com total impunidade. É uma realidade dolorosa, mas também existe a resistência dos povos que não claudicam frente aos poderosos.

São tão grandes as atrocidades cometidas pelo teu país no mundo que dariam assunto para muito tempo, é um desafio para os historiadores que necessitarão investigar e compreender os comportamentos, políticas, gran-dezas e pequenezes políticas, que levaram os EUA à monocultura das mentes de tal forma que não lhes permite ver outras realidades.

A Bin Laden, suposto autor ideológico do ataque às torres gémeas, identificam-no como um Satanás encarnado, que aterrorizava o mundo, e a propaganda do teu governo apontava-o como o “eixo do mal”, e isso serviu-lhes de pretexto para declarar as guerras desejadas que o complexo industrial militar precisa para colocar os seus produtos de morte.

Sabes que os investigadores do 11 de Setembro indicam que o atentado possui muito de “autogolpe”, como o avião contra o Pentágono e o esvaziamento prévio de escritórios das torres; atentado que deu motivo para lançar a guerra contra o Iraque e o Afeganistão e agora contra a Líbia; argumentando com a mentira e a soberba do poder que estão fazendo isso para salvar o povo, em nome da ‘liberdade e defesa da democracia’, com o cinismo de dizer que a morte de mulheres e crianças são ‘danos colaterais’. Isso vivi-o no Iraque, em Bagdad, com os bombardeios na cidade, no hospital pediátrico, e no refúgio de crianças que foram vítimas desses ‘danos colaterais’.

A palavra é esvaziada de valores e conteúdo, razão pela qual chamas o assassinato de “morte”, dizendo que, por fim, os EUA “mataram” Bin Laden. Não tento justificá-lo por qualquer premissa, sou contra qualquer forma de terrorismo, tanto o desses grupos armados, como o terrorismo de Estado que o teu país exerce em diversas partes do mundo, apoiando ditadores, impondo bases militares e intervenção armada, exercendo a violência para se manter através do terror no eixo do poder mundial. Existe apenas um só “eixo do mal”? Como o chamarias?

Será por essa razão que a população dos EUA vive com tanto medo de represálias daqueles a que chamam de “eixo do mal”? O simplismo e a hipocrisia de justificar o injustificável.

A Paz é uma dinâmica de vida nas relações entre as pessoas e os povos; é um desafio para a consciência da humanidade, o seu caminho é trabalhoso, quotidiano e esperançoso, onde os povos são construtores das suas próprias vidas e da sua própria história. A Paz não se dá de presente, ela contrai-se, e é isso que te está a faltar rapaz, coragem para assumir a responsabilidade histórica com o teu povo e com a humanidade.

Não podes viver no labirinto do medo e da dominação dos que governam os EUA, ignorando os Tratados Internacionais, os Pactos e Protocolos, de governos que assinam mas não cumprem nada e não cumprem nenhum dos acordos, mas que falam em nome da liberdade e do direito.

Como podes falar de Paz quando não queres cumprir com nada, salvo com os interesses do teu país?

Como podes falar da Liberdade quando tens inocentes encarcerados em Guantánamo, nas prisões dos EUA, nas prisões do Iraque, como Abu Ghraib, e no Afeganistão?

Como podes falar de Direitos Humanos e da dignidade dos povos quando os violas a ambos permanentemente e bloqueias aqueles que não partilham a tua ideologia, obrigando-os a suportar os teus abusos?

Como podes enviar Forças Militares para o Haiti após o devastador terramoto, e não ajuda humanitária a esse povo sofrido?

Como podes falar de Liberdade quando massacras os povos do Médio Oriente e propagas a guerra e a tortura, em conflitos intermináveis, que sangram palestinos e israelitas?

Barack, olha para cima nesse teu labirinto, podes encontrar a estrela que te guiará, ainda que saibas que jamais a poderás alcançar, como tão bem o disse Eduardo Galeano.

Procura ser coerente entre o que dizes e o que fazes, essa é a única forma de não perder o rumo. É um desafio da vida.

O Nobel da Paz é um instrumento ao serviço dos povos, nunca para a vaidade pessoal.

Desejo-te muita força e esperança, e espero que tenhas coragem de corrigir o caminho e assim encontrar a sabedoria da paz.

Adolfo Perez Esquivel. Nobel da Paz de 1980. Buenos Aires, 5 de Maio de 2011.

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América, América… Do conflito das civilizações ao choque das ignorâncias

Versão portuguesa de. M. Yiossuf Adamgy, publicada na revista Al Furqán, nº. 176, de Julho/Agosto.2010

26 de Agosto de 2010 – Fonte: Oumma

Aquando do seu discurso, no Cairo(1), o ano passado, Barack Obama pregava a reconciliação com o mundo muçulmano: ‘(…) os Estados Unidos e o mundo ocidental devem aprender a conhecer melhor o Islão. Aliás, se contabilizar-mos o número de Americanos muçulmanos, veremos que os Estados Unidos são um dos maiores países muçulmanos do planeta (…). O que procuro fazer consiste em criar um diálogo melhor para que o mundo muçulmano possa compreender melhor como os Estados Unidos, e em termos gerais o mundo ocidental, concebem determinados problemas difíceis, tais como o terrorismo ou a democracia’. Estas palavras, impregnadas de conciliação, tinham sido aclamadas pelos numerosos chefes de estado do mundo árabe-islâmico. Hoje, mais do que nunca, a questão das relações ‘normalizadas’ e ‘pacificadas’ com o Islão regressa, com vigor, à cena local americana. ‘Islam, islamic, Muslims…’ tornaram-se igualmente vocábulos com, muitas vezes, uma conotação negativa no País do Tio Sam, ao julgarmos pelas peripécias do Centro Cultural Islâmico de Nova Iorque. Quem não se lembra do projecto controverso de uma Mesquita a dois quarteirões do Ground Zero, onde se encontravam as torres gémeas destruídas no dia 11 de Setembro de 2001, que ultrapassou um obstáculo importante no início do mês de Agosto, com luz verde dada pela autarquia e com o apoio do Presidente da Câmara de Nova Iorque. Esta decisão muito controversa foi imediatamente assimilada a ‘um insulto à memória das vítimas’ pelos que se opunham ao projecto. Esta protestação geral transformou-se numa verdadeira campanha de descrédito das atitudes islamofóbicas: um autocarro exibindo, nos seus flancos, slogans hostis quanto à edificação de uma mesquita e de um centro cultural islâmico nas imediações de Ground Zero, fotografias de aviões despenhando-se contra o World Trade Center relembrando os atentados do 11 de Setembro…

Cartazes gigantescos ostentando a pergunta ‘Por quê aqui?’ (‘Why here?’), insistindo no ‘carácter provocador’ de um pedido legítimo, contudo garantido pela Primeira Emenda da Constituição dos Estados Unidos.(2)

Sabendo que o anunciante não é nada mais, nada menos do que o organismo SIOA (‘Stop Islamzation of America’, ‘Cessem a islamização da América’), é fácil imaginar que a Estátua da Liberdade tenha ficado transida de assombro nesse grande país onde nos é relembrado, frequentemente, que os direitos fundamentais de todos os cidadãos americanos, sem distinção, são imprescritíveis. A intervenção do Presidente americano e o seu posicionamento ao lado de Michael Bloomberg não acalmou, porém, os ardores dos detractores deste projecto. Perante os ataques constantes, o chefe do Executivo teve até de apresentar alguns esclarecimentos de modo a tranquilizar, nomeadamente, um determinado segmento desta América ultra conservadora que suspeita que este dissimule a sua confissão! (3)

Os detractores deste projecto, accionados pelas associações das famílias das vítimas do 11 de Setembro, e por Sarah Palin – a ex-candidata republicana à Vice-presidência -, reagiram com virulência de modo a interpelar a opinião americana e a denunciar o apoio da Casa Branca. O representante de Nova Iorque na Câmara Baixa do Congresso declarava, recentemente, na CNN, com alguma arrogância:

‘A comunidade muçulmana demonstra insensibilidade e falta de compaixão ao querer construir uma mesquita na sombra de Ground Zero. Infelizmente, o presidente cedeu ao que é politicamente correcto’, lamentou. ‘Embora a comunidade muçulmana tenha o direito de construir a mesquita, abusa deste direito, ofendendo, inutilmente, tantas pessoas que tanto sofreram. A boa escolha, moral, que o presidente Obama deveria ter feito, deveria ter sido exortar os dirigentes muçulmanos a respeitarem as famílias dos que morreram e a levarem a sua mesquita para longe de Ground Zero’.

Os defensores do projecto argumentam que a ‘Casa Córdoba’ ajudará a ultrapassar os este-reótipos negativos aos quais a comunidade da cidade continua a estar sujeita desde os atentados. Mas de nada vale, o tratamento mediático tende a dar a impressão que, afinal, a comunidade muçulmana americana representa uma entidade muito especial, com revindicações no limite da decência.

Além da deriva semântica, infelizmente recorrente desde o ‘Nine eleven’, este episódio conduzidos a um período sombrio da história recente dos Estados Unidos: a caça às bruxas sob uma ideologia institucionalizada: o macartis-mo.(4)

Recentemente, uma personalidade política afirmava:

‘Os EUA aplicaram, com sucesso, relativamente aos comunistas, uma política baseada na ‘repressão’ (Foster Dulles). Deveriam retomar esta filosofia no seu conflito contra o Islão em vez de se entregarem após complacências…'(5)

Incontestavelmente, o vento da intolerância sopra novamente do outro lado do Atlântico e os cerca de 7 milhões de cidadãos americanos(6) são elevados ao estatuto de testa-de-ferro, até mesmo responsáveis de uma ‘dor colectiva’, que levará algum tempo antes de ser exorcizada. Desde a tragédia do 11 de Setembro, os cidadãos americanos de confissão muçulmana habituaremos, infelizmente, a um dispositivo de segurança impressionante e às suas derivas liberticidas.(7)

‘Infelizmente, neste Estado como em todo o País, a islamofobia está a aumentar’, reconhecia Ramsey Kilic, porta-voz do Centro para as relações islâmico-americanas (CAIR).(8)

A este respeito, também não parece ser o momento para a conjuração dos demónios do ódio devido à organização de um ‘dia internacional para queimar o Alcorão’ na data de aniversário dos atentados do 11 de Setembro de 2001. Na origem desta iniciativa, um chamado Terry Jones, pastor de profissão, convida a reduzir a cinzas, na praça pública, o Livro Sagrado de um quarto da humanidade, o próprio fundamento da crença islâmica. Na realidade, trata-se, nada mais, nada menos, de combater ‘o demónio do Islão’, considerado por este homem da igreja como o mal incarnado. Do autor de ‘Islam is of the devil'(9), cultura do ódio, estigmatização e anátemas têm uma completa coerência com esta personalidade de ‘má fé’, em todos os sentidos do termo. À pergunta do apresentador da CNN, ‘Por que razão quer fazer isso a 1,5 mil milhões de pessoas no mundo inteiro?’, responderá sem equívocos:

‘O Islão e a Chariah são responsáveis pelo 11 de Setembro. Queimaremos os livros do Alcorão porque pensamos que já é tempo, para os Cristãos, para as igrejas, para os responsáveis políticos, que se levantem e digam: ‘Não, o Islão e a Chariah não são bem-vindos nos Estados Unidos’.

E cá estamos nós, desta forma, a ser levados para o âmago de determinadas práticas medievais e demais autos-de-fé organizados na época do Terceiro Reich!

Especifiquemos, além disso, que esta alma perdida e cegada pela aversão não é nada mais, nada menos, do que o líder da igreja Dove World Outreach Center (atingir um mundo de paz!): podemos ver que, nos dias de hoje, o ridículo já não mata. As teses huntingtonianas e demais slogans que pensávamos relegados ao esquecimento (‘o eixo do Bem contra o eixo do Mal’) reactivaram-se, desta forma, para ‘justificar’ um combate ‘justo’ destinado a salvar os valores da América. ‘Conflito das civilizações’ e demais ‘fim da história’ são reunidos para propagar outras construções teológicas que, no caso presente, se fundamentam no Islão (‘dar al islam, dar al kufr…’)(10). Assim, em conformidade com uma regra inalterável, os extremos alimentam-se uns dos outros.

Por outras palavras, esta visão cósmica maniqueísta tem a sua consagração no choque das ignorâncias!

O pastor Jones evoca numa ‘lista de argumentos’ 10 razões para ‘justificar’ a sua cruzada contra o Islão.(11) Num inventário ‘à Pré-vert’, o internauta encontrará aí propósitos insultuosos, contra verdades e outros delírios paranóicos (‘A vida e a mensagem de Muhammad não podem ser respeitadas’, ‘Muhammad não terá existido’, ‘A lei islâmica é de natureza totalitária (…) tem muitas semelhanças com o nazismo, o comunismo e o fascismo’, ‘O mundo sofre devido à influência demoníaca do Alcorão’, ‘O Islão representa uma arma do imperialismo árabe e suscita o colonialismo’ …). Daí a comparar o Islão à ‘Besta’ mencionada pelo Profeta Daniel, há apenas um passo… alegremente dado por determinadas ovelhas que privilegiam uma singular hermenêutica.(12) A tradição muçulmana relata que a ignorância é o maior inimigo do homem quando o Alcorão declara:

‘Dize: ‘Serão iguais, aqueles que sabem e aqueles que não sabem?’ Só os dotados de inteligência se lembram’.(13)

Podemos, razoavelmente, pensar que o interessado não é dotado desta última faculdade. Consciente das suas derivas, nas antípodas da fé cristã, a Associação Nacional dos Evangélicos (EU) quebrou os laços de solidariedade ao exigir a anulação do auto-de-fé e ao citar a Primeira Epístola do Apóstolo São Paulo aos Tessalonicenses. A Conferência Mundial das Religiões para a Paz (Religions for Peace, realizada em Nova Iorque) também condenou esta iniciativa perigosa para a coesão e o viver em conjunto.

Um maior cuidado e um dever de indignação impõem-se face aos pirómanos de qualquer espécie, apóstolos da divisão e do ódio e demais epígonos.

Património universal, a humanidade constrói–se na perseverança, razão e fé, na palavra parti-lhada e esforço de uma reflexão constantemente renovada. Viver em harmonia com o outro, com as suas diferenças, abrir-se ao outro na fraternidade e solidariedade, trabalhar para um melhor conhecimento mútuo, respondendo ao convite divino…:

‘Ó seres humanos! Na verdade, criámo-vos a partir de um homem e de uma mulher, e fizemo-vos nações e tribos para vos conhecerdes. O mais nobre de vós, perante Deus, é o mais temente. Na verdade, Deus é Sábio e Omnisciente’. (Alcorão, 49:13).

NOTAS:

  1. 19 de Junho de 2009
  2. A Primeira Emenda da Constituição dos Estados Unidos da América faz parte das dez emendas ratifi-cadas em 1791 e conhecidas colectivamente como a Declaração dos Direitos (Bill of Rights). Proíbe a adopção, por parte do Congresso dos Estados Unidos, de leis que limitem a liberdade de religião e de ex-pressão, a liberdade de imprensa ou o direito a reunir-se pacificamente.
  3. Uma sondagem realizada pelo Pew Research Center para o Washington Post, no dia 19/08/2010, revela que 20% dos Americanos pensam que o Presidente é muçulmano. Paralelamente, o número de Americanos que identificam correctamente Barack Obama como cristão descaiu para cerca de metade, em um ano, para 34%. A Casa Branca teve de apresentar um desmentido! Encontramos, nalguns meios de comunicação americanos e franceses, ‘Obama bin Laden’ caricaturado com uma barba e um turbante.
  4. O macartismo (ou McCarthyism) é um episódio pouco elogioso da história do país, conhecido igual-mente pelo nome de ‘Medo Vermelho’ (Red Scare) ou de ‘caça às bruxas’ (witch hunts). Estende-se de 1950, a aparição do Senador Joseph McCarthy na cena política americana, a 1954, o voto de censura contra McCarthy. Durante dois anos (1953-1954), a comissão presidida por McCarthy perseguiu eventuais agentes, militantes ou simpatizantes comunistas; tudo isto com o seu quinhão de derivas liberticidas.
  5. O governador do Tennessee questiona até a designação de religião no que diz respeito ao Islão que considera ser uma seita ou um partido político! Sobre este assunto, ler ‘Ron Ramsey: Tennessee Republican politician under fire in ‘Islam is a cult’ row’ in The Daily Telegraph publicado a 27/07/2010.
  6. Conforme o Council on American-Islamic Relations (CAIR).
  7. Consultar o estudo de Daniel Sabbagh, Segurança e liberdades nos Estados Unidos após o 11 de Setembro: uma descrição in Critique internationale nº 19 – Abril 2003, Centro de Estudos e Investigações Internacionais.
  8. Council on American-Islamic Relations
  9. Na sua introdução, podemos ler: ‘O Islão é satânico. Aprendei as verdades espirituais que levarão novamente a igreja cristão à posição revelada por Deus’.
  10. O mundo complexo globalizado no qual evoluímos não pode ser reduzido a estes dois campos ini-migos: ‘a residência do Islão’ versus ‘a residência do descrédito’.
  11. Consultar o sítio http://www.doveworld.org/-blog/ten-reasons-to-burn-a-koran
  12. O leitor motivado pela exegese pode consultar Daniel 7.19-27.
  13. Alcorão, 39:9.