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Onde vai a Nação Árabe?

Fonte: Oumma.com – Versão portuguesa: Al Furqán

Onde vai o Egipto? Onde vai a Nação árabe? Gilles Munier fornece algumas respostas numa entrevista concedida ao site islâmico francês, a Oumma.com. Este eminente especialista do mundo árabe aborda a situação política do Egipto, nomeadamente a personalidade do vice-pre-sidente Omar Suleiman, detestado pelo povo egípcio, ‘figura emblemática para a CIA’ neste país, autêntico torcionário ‘que tem as mãos manchadas com o sangue de milhares de dissidentes que não resistiram às torturas praticadas’. Gilles Munier afima, ainda, que ‘todos os países árabes, sem excepção, sobretudo aqueles ligados ao Ocidente, serão ou são afectados, de diversas maneiras, por um protesto popular’.

Como vê a evolução política no Egipto após a partida de Mubarak?

Todos os amigos do povo egípcio questionam-se quanto ao facto de saber se o Conselho Supremo das Forças Armadas honrará, ou não, os seus compromissos até ao fim. O passado do marechal Muhammad Hussein Tantawi, de 75 anos, o seu dirigente, não abona a favor da mudança. Foi nomeado Ministro da Defesa após ter participado, como chefe do Estado-Maior, na guerra do Golfo, em 1991, do lado dos Americanos, e é um dos principais defensores de Israel no seio das forças armadas egípcias. No início desta revolta, encontrava-se em Washington, nos Estados-Unidos, para desenvolver, juntamente com os seus oficiais, cenários que permitiriam canalizar a ira popular.

De regresso ao Cairo, manteve contacto telefónico, durante todo o tempo em que durou a crise, com o ‘amigo’ Robert Gates, chefe do Pentágono e antigo director da CIA. Quais fo-ram os planos que ambos arquitectaram? Em breve ficaremos a saber. O futuro dirá se os egípcios aceitam as modificações da constituição que serão propostas, se as eleições anunciadas serão livres e se os meios de comunicação aparecerão sem medo da censura. A-guardemos pelos próximos acontecimentos, em-bora haja motivos para que sejamos, a curto prazo, pessimistas.

Quem é Omar Suleiman?

No Egipto, Omar Suleiman é odiado. Tem as mãos manchadas com o sangue de milhares de dissidentes que não resistiram à tortura. Era uma ‘figura emblemática para a CIA’ no Egipto, encarregado de interrogar os suspeitos sequestrados pela agência americana no mundo. Enquanto chefe do EGIS – o principal serviço secreto egípcio – pôs, como se costuma dizer, ‘a mão na massa’. Por exemplo, torturou pessoalmente Mandouh Habib, de nacionalidade australiana, detido no Paquistão em 2001. Na sua obra, intitulada My Story: The Tale of a Terrorist Who Wasn’t, o supliciado, encarcerado numa prisão secreta da CIA no Egipto, afirma que o reconheceu e narra que foi ‘electrocutado, afogado e pendurado em ganchos metálicos’.

Omar Suleiman também interrogou Ibn al-Sheikh Al-Libi, um parente de Osama Ben Laden, também ele entregue pela CIA. Segundo um relatório do Senado americano, Ibn al-Sheikh Al-Libi foi trancado numa jaula e espancado. Nessa época, os Estados Unidos necessitavam de ‘provas’ relativamente às relações entre Saddam Hussein e Osama Ben Laden para justificar a invasão no Iraque. A ‘confissão’ do militante, mediante tortura, permitiu que Colin Powell declarasse às Nações Unidas, em Fevereiro de 2003, que membros da Al Qaeda tinham sido treinados no Iraque para o uso de armas químicas e biológicas. Expulso e encarcerado a seguir na Líbia, o seu país de origem, Ibn al-Sheikh ‘suicidou-se’ na sua cela, em Maio de 2009, durante a estadia de Suleiman em Tripoli.

No passado dia 9.Fevereiro.2011, o jornal diário israelita Yediot Aharonot apresentava Omar Suleiman como ‘o homem da estabilidade’. É um dos orquestradores do bloqueio de Gaza. Perseguiu palestinianos suspeitos de serem simpatizantes do Hamas. Esta é uma descrição sucinta de Omar Suleiman. O Conselho Supremo das Forças Armadas afastou-o. E ainda bem. Os egípcios escaparam por pouco: um telegrama diplomático americano que data de Maio de 2007, revelado pela WikiLeaks, descrevia-o como o sucessor ideal de Hosni Mubarak; outro, datando de 2008, descrevia-o como o candidato preferido de Israel. Espero que este torcionário seja, um dia, julgado pelos crimes que cometeu.

Qual o nível de intervenção dos Estados Unidos nos actuais acontecimentos no Egipto?

Os Estados Unidos intervêm no Egipto a todos os níveis desde que o Presidente Anwar al-Sadate expulsou, em 1976, os conselheiros soviéticos que aí se encontravam. Estavam portanto em situação de saber que, mais cedo ou mais tarde, o povo revoltar-se-ia contra o regime que fora imposto, e preparavam-se caso isso sucedesse.

Os cibe dissidentes egípcios, inspirados pelo sucesso da ‘revolução de jasmim’, na Tunísia, formados nos Estados Unidos no âmbito do projecto ‘Novo Médio Oriente’ – uma cópia do ‘Grande Médio Oriente’ de George W. Bush, versão Barack Obama – desencadearam, através do Facebook, uma insurreição que, um dia, inevitavelmente, teria acontecido. Perante a magnitude das perguntas suscitadas, que já nda tinham a ver com os sonhos ingénuos daqueles que as tinham causado, Obama enviou urgentemente o seu conselheiro Frank Wisner (aparentado com Nicolas Sarkozy). A sua missão: garantir que ‘tudo mude para que nada mude’! O resto é história. Caso o Conselho Supremo das Forças Armadas venha a trair a confiança do povo egípcio, é de prever novos tumultos mais graves. Restará apenas uma coisa a fazer: aguardar a chegada na cena política, como sucedeu em 1952, de novos ‘oficiais livres’.

Qual será o impacto das relações com Israel no caso de uma verdadeira democra-tização do Egipto?

A esmagadora maioria dos egípcios apoia a luta do povo palestiniano e considera que o bloqueio de Gaza é um crime. No dia 9 de Fevereiro, durante o jantar anual da Crif, o organismo representativo da comunidade judaica em França, Nicolas Sarkozy declarou que os manifestantes egípcios não gritaram ‘Abaixo o Ocidente’, ‘Abaixo os Estados Unidos’ ou ‘Abaixo Israel’. Mentira. As objectivas das câmaras de televisão estavam apenas viradas para outro lado! É bom falar de liberdade de imprensa no Egipto… Mas seria preferível interrogarmo-nos também quanto à margem de manobra deixada aos jornalistas franceses para comentarem os acontecimentos no estrangeiro e quanto ao tratamento da informação Made in Occident em geral.

No caso de uma verdadeira democratização do Egipto, se Israel continuar a recusar a descolonização dos territórios árabes ocupados, o Tratado da Paz entre Israel e o Egípcio será posto em causa e os regimes árabes que mantêm relações, discretas ou não, com o Estado hebraico estarão na berlinda. A ‘paz’ permitiu que Israel atacasse o Líbano e Gaza, sem recear a abertura de uma frente na fronteira com o Egipto. O questionamento da validade do tratado assinalará o fim da paralisia árabe na questão árabe palestiniana e lidará com a anexação dos montes Golã sírios.

O que acha da ameaça islâmica no Egipto ostentada pelo Ocidente?

Não há nenhuma ‘ameaça islâmica’ no Egipto, embora haja, como em tantos outros lugares, extremistas religiosos. O Islão não é, por natureza, uma ameaça. A suposta ameaça islâmica é uma invenção neoconservadora americana para manter a presença dos Estados Unidos na região, sobretudo nos países que professam um nacionalismo árabe desviado. É ostentada consoante os interesses americanos. Senão, como podemos nós explicar que Washington jamais se tenha aventurado a dar conselhos sobre uma boa governação à família Saud, da Arábia, e que os Estados Unidos tenham instalado em Bagdad um regime confessional xiita pró-iraniano.

A Irmandade Muçulmana não tem nada a ver com a caricatura veiculada pelos meios de comunicação ocidentais. O movimento não é estático, evolui em conformidade com a época. É possível que não concordemos com o seu programa, que a combatamos politicamente, mas, por que razão proibi-la? Isso não é, certamente, democracia. A não ser que seja traída, a revolução egípcia deverá ainda permitir que os progressistas e nacionalistas árabes, nasserianos ou baathistas se regenerem.

Ontem foi a Tunísia e o Egipto, hoje a Líbia; quais os outros países que poderão ser afectados por uma contestação popular?

A juventude árabe já está cansada das velhas badernas que se agarram ao poder, enriquecem às custas do povo, liquidam as riquezas do país. O protectorado americano relativamente ao mundo árabe, estabelecido progressivamente desde a Segunda Guerra Mundial, resultou num imobilismo político-social sufocante. Todos os países árabes, sem excepção, sobretudo aqueles que estão ligados ao Ocidente, serão ou são afectados, de diversas maneiras, por um protesto popular. Não acredito na teoria dos dominós, alguns dirigentes árabes dificultarão as tentativas de mudança, mas durante quanto tempo e, sobretudo, a que preço?

Enquanto especialista reconhecido do Iraque, considera que os tumultos políticos no Egipto terão, também eles, uma influência sobre a situação do Iraque?

Já estão a influenciar o Iraque. Quem sabe que no passado dia 4 de Fevereiro (2011) milhares de iraquianos irados se deslocaram em direcção à Zona verde gritando: ‘Abaixo o parlamento’, ‘Abaixo o governo’? A contestação popular estendeu-se a várias cidades. Em Kut, no dia 16 de Fevereiro, os manifestantes incendiaram a sede da administração provincial. Balanço: três mortos e cerca de trinta feridos. No dia 17 de Fevereiro, em Sulaimaniya, um milhar de manifestantes atacou a sede do Partido Democrático do Curdistão de Massoud Barzani, o presidente da região. A polícia abriu fogo. Balanço: um morto e 35 feridos a tiro.

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Guerra na Líbia

Eduardo – http://c-de.blogspot.com/2011/03/guerra-no-libano.html

Uma guerra injusta, ilegal e, mais uma vez, pelos interesses do petróleo

Os EUA e os tradicionais aliados, França de Sarkozy e Grã Bretanha de Cameron, lançaram os ataques à Líbia, iniciando assim mais uma guerra. Esta com o pretexto da defesa do povo que, como no Iraque, se traduziu em muitas centenas de milhares de mortos, milhões de vítimas e a na ruína do país.

Na Líbia país muito rico em petróleo, e com um regime tribal forte, Kadafi pode não ser santo, mas é o único líder que tem o consenso da maioria das tribos. Neste conflito não se vislumbra o aparecimento de outros líderes, que reúnam um consenso e permitam uma política mais justa para o povo. Não foram abertas portas para um diálogo.

“Dividir para reinar”, é a política do grande capital, que lançou a crise financeira que afecta muitos países capitalistas e, numa “fuga prá frente”, deve estar a preparar a divisão da Líbia, para se apoderar das suas riquezas. Nessa divisão certamente que os EUA, vão querer o controlo das zonas do petróleo. Esse pode ser o grande objectivo ainda escondido. Se relacionarmos isto com o novo conceito estratégico da Nato e na sua intervenção nas zonas do mundo que são muito ricas em matérias primas, podemos verificar uma lógica dos “donos do mundo” nestas acções.

Neste caso, da Líbia, os EUA e seus aliados, antigas potências coloniais europeias, bem como Israel, Egipto, Arábia Saudita e Emiratos Árabes, apesar de não terem provado, genocídios e as barbaridades que afirmam, lançaram acções de propaganda na comunicação social que dominam, para justificar as operações realizadas de fornecimento de armas aos “rebeldes” concentrados em Benghazi, e agora, o ataque ao país, com a cobertura numa Resolução do Conselho de Segurança da ONU que não cobre as acções que estão a realizar.

Repete-se o uso da mentira, utilizada no Iraque.
O descaramento é tal que Berlusconi, envolvido em muitos escândalos, prometeu juntar-se aos agressores. Era mesmo de Berlusconi que estes aliados precisavam para ficar a quadrilha completa.

A Resolução do Conselho de Segurança, obtida com muita dificuldade e 5 abstenções (Alemanha, Brasil, China, Índia e Rússia) não autoriza os ataques e bombardeamentos que estão a ser feitos.
Destina-se a criar uma zona de exclusão aérea para permitir um corredor livre da intervenção de aviões líbios e não consente o bombardeamento nem o ataque a alvos que não tenham a ver com a garantia da zona aérea. Muito menos a resolução do Conselho de Segurança, permite que os EUA escolham os alvos em função das partes em conflito.

Sem respeito pela ONU, os ataques franceses e norte-americanos, tiveram objectivos militares que nada têm a ver com isso mas, apenas, aniquilar as forças governamentais, em combate com os rebeldes no terreno. A coberto dessas acções o Qatar e Emiratos Árabes Unidos estão a armar os revoltosos com novo equipamento militar. Ao seu critério, ‘democrático’, armam uns e desarmam outros. Isto é ainda mais vergonhoso, porque no caso do Bahrein e nas outras revoltas populares, os EUA com os seus aliados árabes, tentam esmagar as revoltas ocorridas noutros países liderados por ditadores, como na Arábia Saudita que, para além do povo, as mulheres são vítimas maiores. Sobre tudo isto a Comunicação Social ‘controlada’ mantém um silêncio hipócrita. Também a ONU, NATO e EU, assobiam para o lado e fingem desconhecer.

A ONU e as organizações controladas pelos EUA, não se preocupam com os palestinos massacrados em Gaza, com a selvajaria da tropa da NATO que massacra indefesos camponeses afegãos, nunca se manifestou contra os aviões da CIA telecomandados (drones) que assassinam velhos, mulheres e crianças no Paquistão, como não se manifestou contra o genocídio americano no Iraque.

No caso do Egipto e Tunísia os povos não precisaram da intervenção estrangeira para se libertarem dos ditadores que sempre foram aliados, financiados e armados pelo ocidente em troca do petróleo.

Os EUA que provocaram a crise financeira que se abate sobre os povos da maioria dos países capitalistas, estão também numa situação de grande crise. Crise económica, financeira e social.
O encadeado de situações verificadas com a rebeldia de alguns “amigos” como Sadan Hussain, e vários líderes do Irão apoiados pelo ocidente, levaram à constante perda de influência dos EUA à queda dos “petro-dólares” e à travagem das compras de Títulos do Tesouro dos EUA pelos países do Golfo.

Recentemente, com os sismos e maremoto no Japão, que debilitou ainda mais a economia há uma década em crise, os EUA vão perder compradores dos títulos da dívida americana (T-Bonds) e vão, como é provável, ter mais um concorrente nas vendas de parte importante das suas reservas em Títulos do Tesouro dos EUA para financiar a reconstrução e o relançamento da economia do Japão.
Note-se que os EUA é o país com a maior dívida espalhado pelos cinco cantos do mundo, mas em especial pela China, Japão e Grã-Bretanha.

Também é quase certo que a redução de investimentos em equipamento em nuclear de produção de energia, juntamente com a instabilidade das revoltas no Médio Oriente, vai agravar a pressão sobre os preços do petróleo do gás e do carvão.

Esta nova guerra lançada pelos EUA, tem tudo isto em consideração, como ‘fuga prá frente’ é, também, uma tentativa para salvar o capitalismo, sistema económico que está em profunda crise. Se vai adiar o fim do capitalismo não me atrevo a prever. Contudo, o que sabemos, e estamos a confirmar no dia a dia, é que, para adiar a morte do capitalismo pagamos todos, nos aumentos de impostos, nos aumentos do custo de vida, nas reduções de salários, no aumento do desemprego, na redução das pensões, na redução da assistência, na qualidade do ensino, nas privatizações e no roubo permanente que o grande capital financeiro, os “mercados”, fazem a todos nós.

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Crise Mundial na Humanidade

Y. A., in Revista Al Furqán, nº. 180, de Março/Abril de 2011

Observamos uma crise mundial da humanidade no seu todo, que apesar dos enormes progressos materiais existentes, está desorientada, descontrolada, desequilibrada, egocêntrica e materialista; apenas interessada no ‘progresso’ (que não é nada mais do que um desenvolvimento verticalista e negativo) e profundamente ateísta (ou não se acredita em Deus ou não se pratica a crença em Deus, amando o próximo); o comum do irreverente (desrespeitoso), o irrisório (burla) do sagrado e a utilização da religião apenas como uma unidade política ou com-promissos sociais). Tudo isto é uma variação do ateísmo.

A actual civilização desenvolveu tecnologia suficiente para construir uma diversidade de formas e modos sobre o nosso planeta, incluindo até para o destruir. Mas descurou de estar em consonância com o desenvolvimento da natureza. Desenvolve conceitos específicos, mas esquece-se das leis universais… O equilíbrio entre as leis da física e os fenómenos biológicos é tão delicado que deve ser mantido de modo a não causar o caos total. Na frenética corrida para o caminho do desenvolvimento tecnológico está-se a quebrar esse equilíbrio de forma irreflectida… Além disso, o ser humano é condicionado para ser escravo deste desenvolvimento. Se a isto juntarmos a carência quer de valores espirituais, quer morais, o fomento do vício e da obtenção de riquezas fáceis, a ânsia desmedida de ‘poder ter’ e ‘ter poder’, que são a base da maioria das consciências individuais, assistimos à geração de uma consciência colectiva débil, que faz com que o desenvolvimento se oriente fundamentalmente para fins militares destrutivos e que depois se adapta, por razões económicas, numa situação de relativa paz a usos pacíficos.

A deterioração lenta e progressiva do meio ambiente, o uso irracional dos recursos naturais, a corrupção, o crime, a fome, a guerra, a intolerância, a falta de respeito pelo direito alheio, o ciúme, o egoísmo, a falta de princípios, o uso dos fortes contra os fracos, o assassinato de seres indefesos, a irresponsabilidade dos pais, as injustiças, a relação desproporcional de pessoas e nações a aumentar o seu poder à custa do sofrimento universal, a perseguição histórica entre opressores e oprimidos, que se complica, hoje, com a variação da perseguição ainda maior entre os próprios oprimidos, etc., etc.

Claro está que a humanidade pode escolher o seu progresso, dando-lhe orientação moral e social… No livro Preceitos de Ouro do Budismo Esotérico do Tibete, encontramos a seguinte mensagem: ‘Antes de dar o primeiro passo, aprende a distinguir o verdadeiro do falso, o sempre fugaz do sempre eterno. Aprende, sobretudo, a distinguir a sabedoria da cabeça (conhecimento) da sabedoria da alma (moral), a doutrina do olho da do coração. Na verdade, a ignorância assemelha-se a um vaso fechado e sem ar; a alma é um pássaro preso no seu interior. Não canta e não consegue mexer uma pena. Mudo e sem resposta, o pássaro está esgotado e morre. Mas mesmo a ignorância é melhor do que a sabedoria da cabeça, a menos que esta tenha também a sabedoria da alma para a iluminar e dirigir… Apesar de nos sentirmos poderosos e ainda que grandes nações se considerem intocáveis e invencíveis, deve-mos lembramo-nos que tudo tem o seu prémio, compensação e punição. Um átomo do bem que façamos será medido e pesado e um átomo do mal também o será, conforme menciona o Sagrado Alcorão. Até mesmo um átomo está sempre presente na mente de Deus, até os cabelos da nossa cabeça estão contados, como as Escrituras dizem. Estes são dias de julgamento e tudo acontece tão rápido que parece que os dias foram encurtados. Devemos orar, orar e meditar.

Muitos esquecem-se de se entregarem a Deus permanentemente. Por esta razão, antes de começar qualquer acção, o muçulmano menciona o nome de Deus, Clemente e Misericordioso, para pedir protecção, recordar a sua finalidade e garantir a inspiração da piedade. Mas também temos de trabalhar e tentar progredir, buscando inspiração em bases morais e espirituais. Jesus, um dos Profetas de Deus, paz esteja com ele, mencionou que não só de pão vive o homem. Mas mencionou o pão e na bela oração que nos ensinou, dirige-se ao Todo Poderoso e suplica-Lhe: ‘O pão nosso de cada dia nos dai hoje’.

Precisamos de trabalhar para esta vida, mas também para a outra e isso é maravilhosamente resumido num hadith (dito) do último Profeta de Deus, Muhammad, que a paz e as bênçãos estejam sempre com ele: Nós temos que trabalhar para esta vida, como se fossemos viver para sempre, mas ao mesmo tempo trabalhar para a outra vida como se fossemos morrer amanhã. Progresso e material de trabalho, mas por razões morais, a par de oração, através de oração, caridade e jejum. Como a mensagem bíblica diz: Buscai primeiro o Reino de Deus e a sua justiça, e todas as outras coisas virão depois.

Se cada um mudasse de forma positiva, a humanidade resolveria os seus problemas.

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O Nascimento da Modernidade Islâmica

(Opinião – 15/03/2011 – Autor: Pepe Escobar* – Tradução: Rebelión) – Versão Portuguesa: Al Furqán

A crença de que o Islão e o Ocidente são antípodas é coisa de tarados tipo apresentadores da Fox News

*Pepe Escobar é autor de ‘Globalistan: How the Globalized World is Dissolving into Liquid War’ (Nimble Books, 2007) e ‘Red Zone Blues: a snapshot of Baghdade during the surge’.
O seu último livro é ‘Obama does Globalistan’ (Nimble Books, 2009).
Pode ser contactado em: pepeasia@yahoo.com.
Fonte: http://www.atimes.com/atimes/Middle_East/MC12Ak01.html

Quando me deslocava pelas estradas de Afeganistão e Paquistão antes e depois do 11 de Setembro, há dez anos, o volume que levava comigo na mochila era uma edição em francês da ‘Jihad’ de Gilles Kepel. Noite após noite, em muitas ocasiões em casas de adobe e perante intermináveis chávenas de chá verde, fui, pouco a pouco, empapando-me da tese principal: que o Islão político não estava precisamente no auge, mas, de facto, em decadência.

Por um lado, tínhamos organizações como al-Qaida, autodesignadas vanguardas dedicadas a acordar do seu sono as massas muçulmanas a fim de desencadear uma revolução global islâmica; na verdade, não eram senão versões muçulmanas das Brigadas Vermelhas italianas e da Fracção do Exército Vermelho alemão.

Do outro lado, tínhamos islamitas como, por exemplo, os do Partido turco do Desenvolvimento e da Justiça da Turquia, prontos para submergir-se na democracia parlamentária de estilo ocidental e que apostam pela soberania do povo, não de Allah.

No apogeu da ‘guerra contra o terror’ – com todos esses B52 a bombardear Tora Bora sem reparar em que Ussama bin Laden escapara já para o Paquistão -, no Ocidente tendia-se a agrupar a maioria dos muçulmanos, quando não todos, no catálogo de jihadistas insensatos.

Concordo com Kepel em que o ‘choque das civilizações’ não era mais que um conceito estúpido, grosseiramente investigado e instrumentalizado pelos neoconservadores para legitimar a sua ‘cruzada’. Mas isso precisava que a história o corroborasse de alguma maneira.

Dez anos depois, pode-se finalmente dizer que a análise de Kepel dava no cravo. O islamismo de núcleo duro, estilo al-Qaida, é um fracasso de bilheteira no mundo muçulmano. Em tudo o que se refere à sua miríade de manifestações – no Iraque, no Magrebe, na península Arábica -, a al-Qaida não é senão uma seita desesperada, destinada à lixeira da história, igual a todos esses ditadores apoiados pelo Ocidente, como o derrotado presidente tunisino, Zine el-Abidine ben Ali, e o ex-presidente do Egipto, Hosni Mubárak, que costumavam ser os pilares da luta do Ocidente contra o Islão radical.

Kepel está hoje à frente do Programa de Estudos para o Mediterrâneo e o Oriente Próximo, da lendária Faculdade de Ciências Políticas, em Paris. Num artigo escrito para o diário italiano ‘La Repubblica’, sela definitivamente a vitória do Islão como democracia em frente do Islão como vanguarda ‘revolucionária’. Salienta-mos a seguinte citação:

‘Na actualidade, os povos árabes ultrapassaram esse dilema ou constrição entre Ben Ali e Bin Laden. Voltaram a entrar numa história universal que viu a queda dos ditadores na América Latina, dos regimes comunistas no Leste da Europa e também dos regimes militares em países muçulmanos não árabes, como a Indonésia ou a Turquia’.

O local à procura do universal

E este é o ponto decisivo: os povos árabes estão agora a começar a construir a sua própria, embora vacilante, modernidade. Kepel pergunta-se porque se produziu na Tunísia a primeira revolução e descobre que a consigna principal estava em francês: ‘Ben Ali, degage’ (‘Ben Ali, vai embora’). A consigna foi fielmente adoptada – ipsis litteris – pelos egípcios, num país em que muito pouca gente fala francês. Adoptaram tal lema revolucionário porque o ouviram na Al-Jazira. Isto permite a Kepel concluir que estas revoluções actuais têm as raízes tanto na cultura local como nas aspirações universais.

E, se bem que os sintomas sejam os mesmos – desemprego, pobreza, corrupção, ausência total de liberdade -, são revoluções diversas que lutam para poder alcançar o poder com estratégias diferentes. Alguns deitam lenha na fogueira dos problemas tribais ou confessionais, outros apostam em si próprios ou em se imunizar da interferência ocidental.

O problema é que os hagiógrafos do império estão a interpretar mal a diversidade de métodos empregados pelos tiranos para esmagar estas revoluções, para assim poder legitimar melhor a aura dos repressivos ‘rapazes bons’ escolhidos

Assim, temos Robert D. Kaplan, vinculado ao Pentágono, a tentar fazer acreditar à opinião pública que se trata de déspotas ilustrados (a dinastia Al-Khalifa no Bahrein, os dois reis Abdulá, o da Arábia Saudita e o da Jordânia) defronte irredimíveis ditadores diabólicos (como Muamar al-Khadafi).

Como se a maioria xiita no Bahrein precisasse dos Al-Khalifa sunitas para promover a formação de uma classe média: condição prévia para o estabelecimento de uma democracia. Os Al-Khalifa não se importaram nunca nem um pouquinho com promover uma classe média, porque, dessa forma, do seu autocrático sistema ‘aberto aos negócios’ só se beneficiava uma pequena oligarquia sunita.

E o raciocínio para defender esses tiranos escolhidos é que alguns países não têm base institucional para uma transição para a democracia; portanto, metem no mesmo saco a Líbia tribal, dirigida pelo ‘malvado’ Khadafi, e os emirados do golfo Pérsico, dirigidos por ‘aceitáveis’ reis e emires.

A estender pontes

Por muito que a modernidade ocidental esteja em crise, isso não significa que o mundo esteja a sofrer o assédio de uma guerra religiosa moderna. A crença de que o Islão e o Ocidente são antípodas é coisa de tarados tipos apresentadores da Fox News. O mundo está a ser testemunha de uma nova cristianização da Europa, bem como de uma nova evangelização dos Estados Unidos. Isto demonstra que modernidade e religião são compatíveis, quer no Ocidente, quer no Oriente Próximo.

Podem proceder de diferentes latitudes culturais: o Ocidente, da decadência da modernidade, e o Oriente Próximo, da decadência do fundamentalismo religioso, para tratar de convergir no mesmo lugar: uma ponte de diálogo entre o Oriente e o Ocidente.

O que Kepel quer essencialmente mostrar é que a Europa e o mundo árabe não têm outra hipótese senão tentar construir uma civilização híbrida – não só em termos de movimentos de capital, bens e serviços, mas também mediante sólidos investimentos na cultura e na educação – do mar do Norte ao golfo Pérsico, com o Mediterrâneo como centro nevrálgico. Isto implica que a Fortaleza da Europa deverá voltar a examinar o seu lugar no mundo e que a Organização do Tratado do Atlântico Norte não tentará condicionar o diálogo mediterrânico.

É um caminho longo e perigoso, com uns quantos Khadafis, Al-Khalifas e Abdulás que há que deitar fora.

O mundo árabe está a sofrer muitos traumas durante demasiado tempo, quase um século desde que as potências coloniais do Reino Unido e da França atraiçoaram a Nação Árabe e repartiram a terra.

A prova autêntica da autoproclamada ‘missão civilizadora’ do Ocidente está precisamente aí, em dar as boas-vindas e em ajudar, com todo o coração, a que o Mundo Árabe alcance a esfera da modernidade.

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EUA falam em democracia nos países árabes, mas receiam-na

Geopolítica – 16/03/2011 – Autor: Ahmad Diab Al Meyui
Fuente: Webislam – Versão Portuguesa: Al Furqán

Por favor, que a ‘ajuda’ internacional a esses povos não chegue uma vez mais.
Por favor, que os EUA não os ajudem mais.

Vários clichés estão a ser criados nestes dias em que a intifada [1] incendeia o mundo árabe e islâmico. ‘Oriente Médio nunca será o mesmo’, ‘democracia’, ‘ajuda humanitária’, embora deliberadamente, as grandes agências monopolizam as notícias que nos mostram bandeiras americanas e israelitas a serem queimadas, bem como dezenas de milhares de crentes a realizarem o seu salat (oração), e evitam falar do grande perdedor destas revoltas, Israel, excluindo dessas ‘democracias’ – à sua imagem e semelhança – as organizações políticas islâmicas.
Não obstante, ouvimos os ‘orientalistas’, os alvitradores devidamente treinados, falarem na desgraça em que cairá o mundo árabe se os islamitas (esta é a grafia correcta, e não ‘islamista’) tomarem o poder.

Por outras palavras, segundo esta afirmação de democracia sui generis, os partidos islâmicos não devem apresentar-se a nenhuma eleição: nem no Egipto, nem na Líbia, nem noutros países árabes, cujos governos ditatoriais cairão inevitavelmente.

Será que estes povos podem sofrer mais do que aquilo que estão a sofrer com o ataque da laicidade em nome de supostas liberdades ocidentais? (Quando se trata de tecer comentários sobre o mundo islâmico, é sempre necessário traduzir aquilo que as grandes agências de informação, monopolizadas pelo sionismo, pretendem realmente transmitir).

Existe uma espécie de messianismo dos líderes norte-americanos quanto ao suposto papel que Deus terá concedido aos EUA, como se esta potência, que assassina, viola e transgride, fosse aquela que leva ao mundo, e, sobretudo aos ‘incivilizados’ muçulmanos, a paz, a democracia e uma boa vida.

(Quando estes bárbaros, na época medieval, eram mais bárbaros do que agora, a civilização islâmica encontrava-se no seu apogeu, como nenhuma outra civilização que jamais tenha existido na História, embora, paradoxalmente, não seja devidamente estudada por darem preferência à história da Grécia e de Roma, sendo esta consubstanciada com a Igreja católica, ou vice-versa, simbiose que levou, em contraposição com outras culturas, à denominação ‘civilização ocidental e cristã’.

Permanece, como já o dissemos, aos olhos e no inconsciente colectivo das massas, uma espécie de predeterminação, como se os EUA, ‘o país da liberdade’, fossem o messias que salvará o mundo da iminente catástrofe muçulmana, do hijab, da burka, da lapidação, da sharía, da ablação do clítoris, e de nada de bom que possa retirar-se deste modo de vida, que, obviamente, em nada se assemelha àquilo que os meios de comunicação transmitem, e que representa a maioria absoluta em 55 países do planeta.

O controlo das notícias sobre aquilo que está realmente a acontecer no mundo árabe muçulmano é de tamanha magnitude que a imprensa ocidental mostra, ou apenas exibe no ecrã, rebeldes destes regimes a dirigirem-se a Deus, em oração, cinco vezes por dia. Não é conveniente relatar nem mostrar a realidade: pois, a maioria dos povos dos países árabes são muçulmanos e imporão, mais cedo ou mais tarde, a sua própria lei.

Os preconceitos contra os muçulmanos vêm do passado, da época anterior às cruzadas, e subsistem ainda hoje. Recorrem a qualquer tipo de estratagema não só para travar o célere avanço do Islão, mas também para o despres-tigiar em todas as suas facetas, com o objectivo acima referido. Querem que os Shaikhs (pessoas que ensinam a doutrina; não quisemos, propositadamente, recorrer à sua tradução em Espanhol, ‘xeque’, devido à confusão gerada pelos famosos ‘xeques’ do petróleo) ensinem como se faz a oração ou se apela à oração, como são as formas de culto, mas não querem que se fale sobre política. (Mas é aqui que o Islão é essencialmente político, e qualquer muçulmano, portanto, desejaria ser regido por esta política. Enquanto os EUA não compreenderem isto, esforçar-se-ão em estabelecer a democracia ao estilo ocidental e as suas leis alheias ao espírito dos muçulmanos e ao seu Livro, o Alcorão, cujo conteúdo ultrapassa a parte religiosa, tornando-se, simultaneamente, o Código Civil e Penal dos muçulmanos, que, em Árabe, se designada Sharía. ‘A pior coisa que aconteceu no Ocidente, dizia uma escritora muçulmana, é não terem estudado nem compreendido a política do Islão’).

A ambivalência de tudo isto é que, quando os EUA e os seus aliados falam em ‘democratizar’ o mundo árabe, na realidade, não pretendem fazê-lo, pelo menos segundo a concepção política e ideológica daquilo que se entende por ‘democracia’, visto que, caso se pratiquem eleições transparentes, todos os partidos de cunho islâmico deveriam participar, ou seja, a sua participação não deveria ser proibida como o foi na era Mubarak.

Os democráticos EUA e os seus aliados temem a democracia nos países árabes porque sabem, de antemão, que os muçulmanos impor-se-iam facilmente. Exemplo disso, foi quando o FIS (Frente Islâmica de Salvação) ganhou as eleições na Argélia e se verificou um golpe de estado para que não assumissem o poder (o presidente Abdelaziz Bouteflika sabe-o perfeitamente). Ou quando o caluniado Hamas venceu de forma limpa as eleições na Palestina e os seguidores de Mahmud Abbás (um mau herdeiro de Yasser Arafat), com a cumplicidade do Estado de Israel, não permitiram que assumisse o poder. O que resta aos muçulmanos, senão lutar perante tamanha humilhação e desrespeito? Ou quando com absoluta desfaçatez, as tropas norte-americanas entraram na Pérsia (actualmente, o Irão), em 1953, para destituir o Primeiro-ministro Muhammad Mossadeq e restaurar o trono do Xá, inimigo do seu próprio povo e lisonjeado pelo Ocidente.

A ex-Secretária de Estado dos EUA, Condoleezza Rice, disse algo interessante quando, em 2005, no Cairo, criticou a política dos seus antecessores afirmando o seguinte: ‘Durante sessenta anos, o meu país, os Estados Unidos, deu preferência à estabilidade em detrimento da democracia nesta região, e não se alcançou nenhuma destas coisas. Agora, optamos por outro caminho: apoiamos as aspirações democráticas do povo’ (mas, como é óbvio, os povos não os apoiam).

Após as Cruzadas e escaramuças incontáveis que visaram a apropriação das terras islâmicas, chegou a vez do colonialismo, numa época pouco distante dos dias de hoje, mais concretamente volvidos cerca de trezentos anos. Todas as potências que usurparam as terras do Islão tinham uma obsessão: pôr termo ao Islão, ou, pelo menos, sepultá-lo, mediante a laicidade, como aconteceu com outras doutrinas sagradas. Não que os colonialistas tenham pretendido apagar a fé islâmica e implementar o Cristianismo, salvo por reflexos culturais, uma vez que as aberrações e o genocídio – um holocausto de que pouco se fala – contra os muçulmanos foram uma reacção em cadeia em todos os países que reprimiram e que nada tinha a ver com a doutrina cristã. Perceberam que o Islão era o freio para as suas atrocidades e que, debilitando a fé dos muçulmanos, poderiam apoderar-se facilmente da sua terra, cultura e petróleo. As riquezas foram o acicate. Mas não conseguiram o que queriam: hoje, estão dessa-creditados em todo o mundo, pois, caiu-lhes a máscara. Quem acredita em Barack Obama quando fala em ‘ajuda humanitária’? Vê-se aqui desespero para que a situação política árabe dos dias de hoje “não os deixe fora da aposta, como diz um ditado popular da região de La Rioja. (Já perderam o Egipto, perderam a Líbia, bem como o Bahrein, a Arábia Saudita, os principados do Golfo, a Tunísia, Marrocos, a Argélia, mas nunca terão o Irão, pois, isto é outra história no seio desta história, embora seja necessário mais tempo para que estes governos dinásticos e monárquicos sejam julgados e aniquilados pelos seus próprios povos. Torna-se necessário explicar que o Islão, na sua mais pura acepção doutrinária, não reconhece monarquias e muito menos a sucessão hereditária).

O cerne de tamanho terramoto nos últimos dias, não são as liberdades que o povo egípcio poderá conquistar após a fuga do seu antigo Presidente, Hosni Mubarak, mas sim que o epicentro de toda esta escalada é saber se um novo governo no país das pirâmides seria capaz de quebrar a paz com Israel. Essa é a questão, pois, o Ocidente, criador destes regimes de terror, não está interessado pela situação dos povos árabes que se debatem entre o pan-arabismo, o nacionalismo árabe e o Islão.

Aos EUA, pouco importou ser um aliado próximo do regime egípcio (que ainda se encontra no poder mediante um autogolpe palaciano) nestes últimos trinta anos em que dera, abrigo ao homem que, a seguir à morte de Anwar El Sadat, assumiu o poder e não hesitou em ser cúmplice de Israel quanto ao genocídio perpetrado por este país em Gaza.

Os EUA e vários países europeus vociferam por aquilo que apelidam de ‘revolução egípcia’, e, à semelhança das carpideiras num aduar, clamam por uma espécie de democracia à sua imagem e semelhança, mas, ao mesmo tempo, temem a democracia que eles próprios defendem, não vá um novo Governo do maior país do mundo árabe deitar por terra o domínio ocidental naquela região.

Quanto a Qaddafi[2] (esta é a transliteração mais próxima do Árabe em caracteres romanos, visto que algumas das letras desse idioma, como a ‘qaf'[3], letra com a qual se escreve Caddafi, não têm equivalência em Português, pelo que as dezenas de formas outorgadas pela imprensa estão erradas (ver, quanto a esta questão, aquilo que o repórter do jornal Clarim da Argentina, na Líbia, escreveu), que foi armado até aos dentes para o Ocidente, a Europa recebeu-o nos seus mais luxuosos hotéis (embora usasse uma tenda), para que o histriónico beduíno da tribo Qaddafa (daí o seu sobrenome) se deleitasse com as esculturais meninas às quais dava aulas sobre o Islão, levando-as, posteriormente, para a Líbia para que aprofundassem a sua ‘doutrina’.

Quanto aos factos consumados e literalmente quanto ao povo em armas e irado e quanto a uma verdadeira guerra civil, os EUA e aliados estão a fazer o que sempre fizeram: trair os sátrapas (foi o que fizeram com Faisal do Iraque, com o Xá Reza Pahlavi, com Hosni Mubarak, e agora com Muammar Al Qaddafi, e é, claro, o que continuarão a fazer enquanto os seus interesses estiverem em jogo).

E pouco ou nada se diz acerca de Israel, o principal derrotado nesta verdadeira revolução que incendeia o mundo árabe. A ONU condenou tibiamente Qaddafi, a NATO encontra-se na costa líbia, o procurador do Tribunal Penal Internacional, o argentino Luis Moreno Ocampo, investigou-o como ‘criminal de guerra’, mas, excepto alguns países árabes, o Ocidente não vacilou quando Israel matou centenas de crianças, sem falar dos civis que assassinou na sua última escalada em Gaza. O regime sionista não é um ‘criminoso de guerra’.

De qualquer forma, avizinha-se uma nova era. É bem possível que o Egipto e a Jordânia, dois países árabes que fizeram a paz com Israel à revelia dos seus próprios povos, derrubem estes protocolos. Países como a Tunísia, a Argélia, Marrocos e, em seguida, os do Golfo e as suas monarquias, também mudarão os seus governantes pressionados por esta revolução.

Levará tempo, mas o mapa desta parte do mundo mudará, as políticas mudarão e o grande perdedor, Israel, ver-se-á forçado a regressar, como primeira medida, às fronteiras de 1967.

E, por favor, que a ‘ajuda’ internacional a estes povos não chegue uma vez mais. Por favor, que os E.U.A. não os ajudem mais.

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[1] Esta expressão, muitas vezes utilizada para fazer referência a uma insurreição contra um determinado regime, pode ser traduzida por ‘revolta’ (N. T.).

[2] Manteve-se a grafia conforme o artigo original, visto que o autor defende o facto de esta ser a grafia mais próxima em termos de transliteração, afirmando que as restantes grafias que possamos encontrar na imprensa não são adequadas (N. T.).

[3] Letra do alfabeto árabe (N. T.).